Seu filho é mordedor ou volta mordido para casa? Saiba lidar com essas situações
Qual criança nunca voltou mordida da escola? A marca deixada pelos dentes do coleguinha na pele do nosso filho está entre as coisas que mais irritam os pais no início da vida escolar.
Ficamos nos perguntando como a professora não percebeu e evitou o ataque. Depois, questionamos o tipo de educação que essa criança recebe em casa. Nos transformamos em inquisidores do jardim da infância. Até que um dia o nosso filho, aquela criança bonitinha e meiga, vira o mordedor da história.
Sim, não se surpreenda. Morder é uma reação normal durante a primeira fase infância. Antes de pedir que a escola expulse o amiguinho mordedor, saiba que as crianças recorrem às dentadas para expressar desejos ou frustrações, pois ainda não sabem muito bem como comunicar seus sentimentos.
A terapeuta infantil Thaís Moraes diz que “morder, puxar e agarrar representam as principais vias de comunicação e de exploração do ambiente” para crianças de até 3 anos. “Tais comportamentos são esperados e até mesmo desejáveis, já que a exploração do meio permite à criança construir ativamente entendimentos e conhecimentos sobre a realidade, baseadas nas próprias experiências”, afirma.
Apesar de normal, pais e educadores não podem ignorar esse comportamento. “A mordida é uma forma de expressão que não pode ser aceita e deve ser trabalhada com a criança e com a família para que não volte a se repetir”, diz a terapeuta Renata Soifer Kraiser, autora do livro ‘O Sono do Bebê’.
Muitas mordidas acontecem por impulso, durante a disputa por um brinquedo, sem a intenção de machucar o amiguinho. “O cérebro da criança ainda não se desenvolveu o suficiente para oferecer a ela opções de comportamentos mais sociais. É difícil controlar o impulso de morder”, diz Thaís.
E como ensinar a criança mordedora a parar de morder? Segundo Thaís, é complicado ensinar para crianças muito pequenas a pensar antes de agir. “As intervenções que funcionam melhor são as que ensinam a pensar depois de ter agido. Essas intervenções estão de acordo com o processo de desenvolvimento e maturação biológica do cérebro”, diz.
Para ela, ensinar à criança o que pode nessa fase do desenvolvimento é mais eficaz do que tentar explicar o que não pode.
“Pais e educadores podem aproveitar essas situações para ensinar e estimular resoluções de conflito harmoniosas e entender o contexto da mordida. O que a criança quis comunicar? Ela mordeu para disputar o brinquedo com o colega? A partir daí, o papel do adulto é promover a substituição da mordida por comportamentos mais adequados, mediados pela linguagem.”
Segundo ela, os adultos devem traduzir à criança que morde o seu comportamento. “É importante nomear o sentimento que motivou o ato, bem como o sentimento da criança que foi mordida e, em seguida, oferecer uma melhor opção. A comunicação deve ser simples e direta, preferencialmente, falando-se à altura da criança: ‘você mordeu seu amigo porque estava com raiva. Morder não pode. Seu amigo agora chora, sente dor e está triste. Peça desculpas e diga que quer brincar também’.”
Renata aconselha que os pais também ensinem a criança a falar e nomear seus sentimentos. “Quando ela começar a chorar ou a gritar, pergunte: ‘Meu filho, você está bravo porque quer o brinquedo, é isso? Então diga: “eu quero o brinquedo”. E assim que seu amigo terminar de brincar será a sua vez. Não precisa gritar nem morder. Diga que nós vamos entender.”
Segundo ela, os pais da criança mordedora precisam dizer a ela que isso é errado e ensiná-la a pedir desculpas. “Ela também deve se comprometer a não fazer mais isso e sem a promessa de receber algum tipo de recompensa. Diga que isso é errado, que não podemos morder os outros, que você não vai aceitar que ela machuque outras pessoas.”
Renata diz que os pais devem servir de exemplo para a criança não usar a mordida como forma de expressão. “Os pais não devem usar a agressão para educar. Se os pais ferem para mostrar o que querem, a criança fará o mesmo. É importante que os pais apontem a atitude errada dos filhos e mostrem seu descontentamento com segurança e firmeza, impedindo a ação errada, mas sem agredir fisicamente nem verbalmente ou com gritos.”
Se o seu filho é vítima das mordidas, não o ensine a revidar mordendo. Segundo Thaís, é importante que os pais também nomeiem o sentimento de ser mordido ao filho e expliquem o que aconteceu. “Digam que o comportamento do colega não foi legal e que ele não poderia ter mordido. É importante que o pai acolha e valide a emoção do filho sem, contudo, incentivá-lo a revidar.”
Renata recomenda que os pais da criança mordida ensinem o filho a comunicar o ataque à professora.
“Aprender a esperar sua vez, a lidar com limites e frustrações também é parte da educação. A criança que morde pode estar com dificuldade de lidar com esses aspectos e os pais precisam exercitar em casa, ensinando o nome dos sentimentos como medo, raiva, tristeza, dor, para que a criança aprenda o a expressar seus sentimentos por palavras e não por mordidas.”
CLIMA DENTRO DE CASA
Em algumas ocasiões, segundo Renata, a mordida reflete situações de estresse familiar. “Trabalhar o clima da família também é um caminho. Às vezes, a mordida é reflexo de problemas, como doença, crise conjugal ou crise financeira.”
Nesses casos, Renata recomenda que a família crie momentos agradáveis para aliviar o estresse, como passeios ao ar livre, piqueniques ou encontro com amigos queridos. “Tudo isso pode ajudar a relaxar. A terapia de casal ou individual também pode ser uma opção.”
AQUI NA MINHA CASA
Meu filho nunca foi um serial mordedor. E nunca tinha sido mordido com violência até os 2 anos.
Agora, aos 3 anos, voltou com uma mancha roxa imensa no braço, rodeada por marcas pontudas de dentes. Nem parecia que eram dentadas de um mini-ser.
A professora me chamou, disse que a outra criança tinha sido tão rápida que não foi possível evitar a mordida. Eu não tinha ficado muito brava até ver as marcas na pele dele.
Pouco tempo depois, a escola trocou sem querer a agenda do meu filho com a do coleguinha mordedor. Eu só fui perceber a troca até ver o recado: ‘hoje, fulano mordeu beltrano’. Sem conter minha curiosidade, folheei outros dias da agenda. Em quase todos os dias a mãe era avisada sobre as mordidas que o filho dava.
Fiquei com dó. Coloquei-me na situação dela e imaginei que não deveria ser tarefa fácil ensinar o filho a não morder. Como resposta, fui em busca desse post.