Cultura cesarista faz sobrar vagas em casas de parto

Giovanna Balogh

Mulheres que querem fugir do ambiente e das intervenções hospitalares e não se sentem seguras para ter o bebê em casa têm as casas de parto como alternativa para ter seus filhos.

Na Europa esse modelo de atendimento é muito comum, mas no Brasil a procura por esses locais ainda é baixa. Desde janeiro de 2012 até agora, a Casa Angela, no Jardim Mirante (zona sul de SP), realizou 182 partos, ou seja, uma média de nove partos por mês quando tem a capacidade de fazer até 30 partos neste período. Na Casa de Parto Sapopemba, na zona leste da cidade, também há poucos pacientes. Em média, são feitos 20 partos por mês quando a capacidade é de até 60.

Para a gerente da casa da zona leste, a enfermeira obstétrica Kátia Guimarães, 41, a procura é baixa porque a cultura da nossa sociedade é de cesáreas. “As mulheres acham que o parto normal é sofrer, mas não é. É um ato fisiológico. Infelizmente as mulheres descobrem a gravidez e já marcam a cesárea”, lamenta.  O Brasil é um dos países recordistas em cesáreas com taxas superiores a 90% em hospitais particulares. Na rede pública, a  frequência de cesáreas aumentou de 37,8%, em 2000, para 52,3% em 2010.  A OMS (Organização Mundial da Saúde) recomenda que a taxa de cesariana não ultrapasse os 15%, e alerta que o excesso de partos agendados aumenta a mortalidade de mães e crianças.

Mesmo com planos de saúde que cobrem até os hospitais de referência da cidade, gestantes  percorrem quilômetros para ter atendimento nesses estabelecimentos que permitem um parto humanizado.

Poder escolher a posição que se sente mais confortável durante as contrações, decidir quem vai acompanhá-la na hora do nascimento e ter o bebê no colo assim que ele nascer são algumas das prioridades dessas gestantes.

Nas casas de parto, bebê vai direto para o colo da mãe e mama assim que nasce (Foto: Shutterstock)

 

Segundo Kátia, metade das mulheres atendidas no local, que é mantido pela Prefeitura de São Paulo e faz atendimentos totalmente gratuitos, são mulheres que têm convênio, não moram na região e querem ter um parto natural. Esse perfil de pacientes é o mesmo da Casa Angela, que faz atendimento gratuito para moradores da região e cobra para quem é de fora. O local não divulga o valor do parto já que cada caso é estudado individualmente e o pagamento pode ser negociado.

Moradora da zona sul, a funcionária pública Wanessa Campos, 30, optou em ter o filho Arthur na Casa Angela, em dezembro do ano passado. Ela conta que o marido perdeu o emprego e o plano de saúde quando estava grávida e que não tinha como pagar pelo parto.  Wanessa conta que temia ser atendida em um hospital público e ter uma cesárea desnecessária.

Ela diz que no dia do parto foi recebida por duas enfermeiras que ficaram ao seu lado junto com o marido durante o trabalho de parto, que durou uma noite inteira. “Ia para o chuveiro, sentava na banqueta. Enquanto isso, as enfermeiras eram super atenciosas, me alimentavam me dando melão que era a única coisa que eu conseguia comer. Elas me abanavam, faziam massagens”.

Wanessa conta que o tratamento foi bem humanizado e que a recepção do pequeno Arthur também foi como ela e marido planejavam. “Meu filho veio direto para o meu colo, o pai cortou o cordão e acompanhou tudo. Fomos cuidados como filhos lá, com muito respeito.”

BAIXO RISCO

Para ter o atendimento nesses locais, a gestante deve ter gravidez de baixo risco. Mulheres com pressão alta, gravidez gemelar, diabetes são vetadas na triagem que é feita durante a reunião de acolhimento das mães.

Nas casas de parto existem ambulâncias na porta 24 horas que são acionadas no caso da necessidade de uma remoção para um hospital.  Na Casa Angela,  a taxa de remoção é, em média, de  14%. “Isso acontece quando o trabalho de parto não evolui bem, quando a mãe quer anestesia ou se há o rompimento da bolsa cedo e a gestante não entra em trabalho de parto”, explica a enfermeira obstétrica da Casa Angela, Franciely Schermak, 31.

Em Sapopemba, dos 249 partos realizados neste ano, apenas 17 tiveram necessidade de remoção.

Se a paciente tem convênio, a transferência é feita para o hospital de sua preferência. Já as que são atendidas pelo SUS (Sistema Único de Saúde) são levadas para hospitais de referência da região, como o Vila Alpina e o do Campo Limpo, que são os mais próximos das casas de parto.

Nas casas de parto as intervenções na parturiente são raras. Na Casa Angela, por exemplo, houve apenas um caso de episiotomia  (corte cirúrgico feito no períneo) até hoje. “A maioria tem o períneo íntegro ou pequenas lacerações. As mulheres ficam muito à vontade no trabalho de parto. Podem ter o bebê na banheira, de cócoras na banqueta, enfim, ela escolha como se sente melhor para parir o que evita as lacerações”, explica a enfermeira obstétrica Franciely.

Outra vantagem das casas de parto é que o bebê não fica longe da mãe em nenhum momento. A alta da mãe e do filho, se tudo ocorrer bem, acontece em 24 horas.

A gestante também tem no local o acompanhamento da gravidez e do pós-parto, como cuidados com os bebês nos primeiros dias e amamentação. A assistente administrativa Michele Aquino, 33, teve os dois filhos na Casa de Parto de Sapopemba. “Assim que meus filhos nasceram, vieram para o peito. As enfermeiras orientaram sobre as posições e ensinaram  sobre a importância da amamentação”, comenta.