Famílias fazem protesto nacional para pedir humanização do parto
Famílias de várias cidades do Brasil organizam para o próximo sábado (19) a Marcha pela Humanização do Parto. A ideia do protesto, que contará com a presença de profissionais de saúde, gestantes, bebês e crianças, é alertar sobre as represálias que têm sofrido profissionais, como obstetras e enfermeiros, que priorizam o parto normal e humanizado dentro de hospitais.
O protesto ganhou força após a médica obstetra Andrea Campos ser descredenciada do Hospital São Luiz, uma das poucas unidades na capital paulista que têm salas voltadas para o parto humanizado com som ambiente, luz diferenciada, banheira, bola e banqueta para serem usadas pela mulher para aliviar as dores durante o trabalho de parto. A decisão do hospital gerou uma grande revolta de pacientes e ex-pacientes da médica nas redes sociais que decidiram fazer o protesto próximo ao Dia do Médico, celebrado amanhã (18).
Questionado sobre o motivo do descredenciamento, o hospital enviou uma nota onde diz apenas que o cadastro da médica “encontra-se temporariamente suspenso, para apuração de fatos que estão sob sindicância pela Comissão de Ética Médica” do hospital. O São Luiz disse ainda que é pioneiro na prática de parto humanizado.
Além da médica, em agosto, a enfermeira obstetra Adelita Gonzalez Martinez Depinote, 32, foi afastada da função após sete anos atendendo partos na maternidade do Hospital Vitor Ferreira do Amaral, em Curitiba (PR). Professora de obstetrícia na PUC-PR, Adelita diz que ela e outros profissionais são perseguidos por priorizarem o parto humanizado, dando possibilidade da gestante ter acompanhante durante o trabalho de parto, receber massagens e escolher a posição que acha mais confortável para dar à luz. “Foi alegado que eu não cumpro as normas da instituição, mas nunca ficou claro que normas são essas”, relata. “Vejo o parto não só como um ato físico, mas espiritual, social e emocional”, afirma.
Segundo ela, houve perseguição de médicos pediatras e da direção de enfermagem e administrativa. “Achavam absurdo esperar o cordão umbilical parar de pulsar para então cortar ou da mulher parir de cócoras, mas tudo isso é baseado em evidências científicas”, ressalta Adelita, enfermeira obstétrica desde 2004 e que também realiza partos domiciliares. Procurado pelo Maternar, o hospital, da Universidade Federal do Paraná, não se manifestou sobre o caso.
De acordo com os organizadores, além da perseguição contra esses profissionais, a manifestação também é contra a cultura cesarista instaurada no país. O Brasil tem uma das taxas mais altas de cesáreas do mundo, chegando a 90% no setor privado e quase 50% no setor público. Segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde), essa taxa deveria ser de até 15% de cesáreas, ou seja, somente quando a cirurgia é indicada e necessária.
O movimento afirma que não é contra as cesáreas, mas que ela deve ser feita apenas quando “há risco envolvido e comprovado para mãe ou bebê e não de forma eletiva e fora do trabalho de parto, como tem ocorrido em todo país”.
As manifestantes em São Paulo vão se concentrar em frente ao prédio da Gazeta, na avenida Paulista. O protesto vai acontecer em pelo menos 26 cidades (confira a programação no quadro). Na capital paulista, a ideia também é pedir que seja julgada com rapidez uma ação civil pública de 2010 onde o Ministério Público Federal pede que a Justiça Federal condene a ANS (Agência Nacional de Saúde) a regulamentar os serviços obstétricos realizados por planos de saúde privados. O objetivo é que a regulamentação leve a uma diminuição ou evite a realização de cirurgias cesarianas desnecessárias.
Ontem em São Paulo, vereadores da Câmara aprovaram um projeto que cria o parto humanizado na rede pública municipal. Segundo a vereadora Patrícia Bezerra (PSDB), autora do projeto, isso não é praxe nos hospitais municipais. A proposta seguirá agora para a sanção do prefeito Fernando Haddad (PT).
O coletivo Marcha pela Humanização do Parto surgiu no ano passado quando mulheres comuns se uniram para protestar contra duas resoluções do Cremerj (Conselho Regional de Medicina do Rio de Janeiro ). A entidade de médicos passou a considerar infrações éticas a participação de médicos nos partos realizados em casa e de parteiras e doulas (acompanhantes que dão auxílio para a parturiente antes, durante e após o parto) nos partos realizados em hospitais. As resoluções geraram protestos em 32 cidades e depois tiveram seu efeito suspenso por decisão da Justiça.