No RS, mãe é separada do filho ao ser flagrada dando tapa no rosto

Giovanna Balogh

O barulho foi escutado do outro lado da rua pelo vigia que fazia a segurança do restaurante. Apesar de não ter visto a cena, soube pouco depois que era o som de um tapa dado no rosto de uma criança. A agressão partiu da mão da mãe do menino de oito anos. O caso só foi conhecido porque um cliente do restaurante decidiu procurar a polícia para denunciar.

O fato aconteceu na quarta-feira no bairro Menino Deus, em Porto Alegre (RS), no mesmo dia que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou a lei da palmada, que recebeu o nome de “Lei Menino Bernardo” em homenagem a Bernardo Boldrini, assassinado no mês passado no Rio Grande do Sul. O texto agora vai ser analisado pelo Senado.

O economista Robson Valdez, 38, conta que deixava o restaurante com o filho de sete anos quando viu uma mulher distraída com seu smartphone na porta. Ele diz que logo em seguida viu uma criança esbarrando em uma senhora que falou ‘cuidado menino!’. “Em uma fração de segundos, a mulher que estava ao celular deu um tapa muito forte no rosto da criança”, conta. Só então ele percebeu que elas eram a avó e a mãe daquele menino.

“O menino nem viu de onde veio a palmada, ficou assustado e parecia muito humilhado. Ficou um bom tempo com a mão no rosto”, lamenta.
Em seguida, as duas mulheres e o menino procuraram uma mesa para sentar. O economista diz que a impressão que dava era de “que nada havia acontecido”. Valdez comenta que ficou chocado com a agressividade e pela naturalidade da mãe após bater no filho.

Para Valdez, o mais estranho é que as outras pessoas que estavam no restaurante não fizeram absolutamente nada. O economista diz que não entende o fato de as pessoas acharem normal e correto bater em criança e se chocarem, por exemplo, com violência contra animais e idosos. “Por que a criança merece menos proteção do que outros seres humanos ou mesmo um animalzinho?”, questiona. O economista diz que os dois filhos, de sete e 10 anos, são educados com limites, mas que para isso nunca precisou levantar a mão contra eles.

O economista conta que não conversou com a mãe, mas decidiu procurar a Polícia Militar que chegou pouco mais de 10 minutos após ele ligar para o 190.

QUESTÃO DE FAMÍLIA

Assim que os policiais chegaram, conta Valdez, ficaram reticentes em falar com a mãe por se tratar de ‘uma questão de família’. Ao ser abordada pelos policiais, no entanto, a advogada admitiu que bateu no filho.

Procurada pela Folha, ela disse que acertou o rosto do menino, mas negou que essa fosse sua intenção. “Foi um caso extremo, ele estava batendo na avó com uma ripa e eu só queria tirar o pau da mão dele, não queria acertá-lo”, comenta a advogada que teve o nome preservado pela Folha para evitar a identificação da criança.

Logo após a agressão, no entanto, a testemunha disse que ela justificou a agressão como forma de não criar “um delinquente no futuro”. Na hora, o economista diz que ela tentou confrontá-lo perguntando se ele nunca tinha batido nos filhos. “Como neguei, ela ainda foi irônica e disse ‘ah, tá bom. Então faz um manualzinho aí para a gente”, afirma.

Ao ver o rosto vermelho do menino e pela mãe ter admitido a agressão, a PM encaminhou o caso para o Conselho Tutelar e para a Deca (Delegacia de Polícia de Crianças e Adolescentes), onde a ocorrência foi registrada. O pai da criança, que vive em outra cidade, foi acionado e também teve de ir ao local.

A decisão do Conselho Tutelar foi afastar temporariamente o menino do convívio da mãe e encaminhar o caso ao Ministério Público. O conselheiro tutelar Francisco Charles Vieira Soares, 54, conta que o menino ficará sob os cuidados da avó. A medida, segundo ele, foi feita para proteger o menor e que caberá ao juiz decidir se ela perderá a guarda ou se terá, por exemplo, que fazer tratamento psicológico para ficar com o filho.

Ao conselheiro, ela teria dito que bateu no filho pois ele não a obedeceu. “Infelizmente, a nossa cultura ainda é da agressão. As pessoas acham que para educar, é preciso bater”, comenta o conselheiro. Ele pede que as pessoas denunciem para o disque 100 casos de agressão. As denúncias podem ser feitas anonimamente.

A mãe da criança disse à Folha que a situação realmente ganhou uma proporção maior do que a necessária, mas que se for encaminhada para um psicólogo, por exemplo, que pretende tirar uma lição disso. “Em partes foi bom pois o meu filho também aprendeu. Ele falou que também nunca vai bater em ninguém”, diz. A advogada conta que o filho, que estuda em um colégio particular da cidade, é muito agitado e que muitas vezes ele “não escuta”. Ela nega, no entanto, ter agredido ele outras vezes.

A psicopedagoga Lilian Rodrigues Santos diz que educar é um ato de amor e que os filhos são espelhos dos pais. “Se você gritar, seu filho vai gritar igual. Se bater, ele também vai bater”, comenta. Na hora de chamar à atenção de uma criança, por exemplo, ela recomenda aos pais sempre manter o tom de voz baixo, abaixar na altura da criança e olhar no seu olho para conversar. “As crianças que apanham podem se tornar pessoas fechadas, agressivas, além de terem aumentadas as chances de desenvolver problemas emocionais sérios. Apanhar pode prejudicá-las muito, tanto agora, quanto no futuro.”