Autor de ‘Bésame Mucho’, pediatra diz que não devemos obrigar crianças a comer
O pediatra espanhol Carlos Gonzáles está lançando no Brasil a versão em português do livro “Bésame Mucho”. Ele já é cultuado pelas mães brasileiras por seu trabalho com amamentação _ele é autor do livro ‘Manual Prático de Aleitamento Materno’.
Em “Bésame Mucho”, Gonzáles fala da importância da criação com apego para o desenvolvimento das crianças.
Segundo ele, crianças não ficam mal acostumadas porque são carregadas demais no colo.
Gonzáles diz que os pais não devem pressionar os filhos a comer. “Da mesma forma que não se diz quanto ar se deve respirar, não devemos ditar aos filhos quanto eles devem comer.”
Segundo ele, também não se deve dar de comer aos filhos. A estratégia é deixar a comida na frente deles para que comam sozinhos.
Defensor da cama compartilhada, o pediatra diz que as próprias crianças deixam a cama dos pais por vontade própria conforme vão crescendo. Esse sistema é condenado pela SBP (Sociedade Brasileira de Pediatria), que vê riscos de sufocamento para a criança.
Em relação às birras e manhas, que incomodam tantos pais, Gonzáles diz que os adultos devem ensinar as crianças por meio de exemplos.
Leia abaixo a entrevista de Gonzáles para o blog Maternar:
Nós estamos criando nossos filhos com pouco amor? Mães que trabalham fora dão menos carinho ou são mais relaxadas com a criação dos filhos?
Acredito que em geral todos os pais amam seus filhos. O problema é alguns não se atrevem a prová-lo (não carregam a criança no colo, não dividem a cama com ela, a deixam chorar ou a ignoram para não estragá-la) e outros têm pouco tempo para gastar com seus filhos. Mas o amor requer contato e tempo, até mesmo para os adultos. A noiva e o noivo gostam de se olhar, de passar o dia juntos, de se abraçar e beijar, de passear de mãos dadas. Não é fácil manter um namoro à distância.
Até que idade podemos usar a cama compartilhada? E como fazer para que uma criança criada em cama compartilhada passe a dormir em seu próprio quarto sem traumas?
Pode-se usar até que os pais e as crianças queiram. Um estudo na Suíça mostrou que 40% das crianças de 4 anos dormiam na cama dos pais pelo menos duas noites por semana. Aos 10 anos, esse percentual caiu para 12%. Quando a criança cresce, ela vai querer começar a dormir sozinha.
Como identificar quando o choro é de fome, cólica, fralda suja ou sono? Alguma recomendação para a cólica?
A verdade é que eu tenho três filhos, mas eu nunca fui capaz de distinguir por que eles choravam. É preciso ir tentando. Quer peito? Não, não para de chorar. Quer colo? Não, não para de chorar. Quer que eu cante? Também não. Vamos tentar o peito de novo? É assim, tentando, até ele parar de chorar.
Muitas mães receberam a instrução de que colo demais poderia deixar o bebê mal acostumado. O que o senhor pensa desse conselho?
Você conhece rapazes de 15 anos que são carregados no colo porque foram mal acostumados? É bobagem. Crianças pequenas ficam no colo, tomam peito (ou mamadeira), usam fraldas, andam em carrinhos. Os grandes caminham, comem, vão ao banheiro. É normal. Não mudam porque educamos ou acostumamos de uma forma ou de outra. Eles mudam com o tempo, mudam porque crescem.
Várias mães sofrem com as noites mal dormidas. O que esperar do sono do bebê?
De 4 a 5 meses, os bebês tendem a acordar a cada hora e meia. E nesse meio tempo, mesmo dormindo, se movem e fazem barulho. Às vezes, as mães perdem o sono tentando fazer o bebê dormir à noite. O bebê não precisa dormir, pode dormir durante o dia. É a mãe quem precisa dormir. O truque é ir para a cama com o bebê e tentar dormir; e responder o mínimo possível aos movimentos dele na cama. Basta seguir dormindo.
Algumas mães recorrem a técnicas para ensinar o bebê a dormir? E sobre deixar o bebê chorando no quarto sozinho?
Se você o deixa chorando, está ensinando a chorar. E ele vai se acostumar?
O que o senhor pensa sobre punição, castigo e cantinho do pensamento? Há alguma ferramenta menos traumatizante que mães de crianças birrentas possam usar?
Qualquer mãe sabe como controlar seu marido sem punição. Basta dizer-lhe o que fazer. Basta usar o mesmo método com as crianças (que é que às vezes as crianças não obedecem. Bem, às vezes os maridos também não. Ninguém é perfeito).
Como lidar com crianças manhosas e birrentas, aquelas que se jogam no chão do shopping ou dão um tapa na cara dos pais dentro de um restaurante?
Uma criança não age assim sem motivo. Ela tem esse comportamento porque está cansada e porque algo a está incomodando. Só que os pais também estão cansados e a conduta do filho os incomoda. É uma excelente oportunidade para ensinar a teu filho com exemplos. Que queres que faça teu filho quando algo te incomoda? Pois é isso que tem que fazer quando ele te incomoda. Queres que ele pegue alguma coisa? Pegue você. Queres que ele grite? Grite você. Queres que ele conserve a calma e tenha paciência? Então conserve a calma e tenha paciência. Com certeza ele não vai aprender logo de primeira. É uma criança pequena, vai demorar anos. Mas se você seguir dando o bom exemplo, no final ele aprenderá.
Muitas mães se queixam que os filhos não comem ou comem mal. O que fazer? O que o senhor pensa das técnicas para ensinar as crianças a comer melhor?
Não se deve nunca obrigar uma criança a comer. Por nenhum motivo com nenhum método, por mal ou por bem, [castigos, ameaças e chantagem, prêmios, promessas, distrações, exortações, louvores e insistência. Assim como nós não dizemos a ele quanto ar deve respirar, nós não dizemos quanto comer.
O que as mães podem fazer para que os maridos participem mais, acordem mais de madrugada, deem comida, banho, façam a parte prática?
Você pode dizer a ele: “Querido, pode trocar a fralda do bebê? Estou muito cansada”. Ou então: “Querido, poderia dar o banho no bebê hoje? Com você ele fica tão relaxado…” Nós homens temos boa intenção, fazemos qualquer coisa que nos peçam direitinho. E quanto a dar de comer, o truque é não dar de comer, não se deve meter-lhes a colher na boca. Deve-se colocar a comida na frente deles e deixar que as crianças façam o que quiserem. Aos pais cabe comprar, cozinhar e lavar os pratos.