Obstetras e obstetrizes defendem atuação de doulas e rebatem futuro presidente da Febrasgo

FABIANA FUTEMA

Obstetras e obstetrizes que atuam na defesa parto natural rebateram as críticas do obstetra César Fernandes, 64, à atuação das doulas. Em entrevista à Folha neste domingo, Fernandes criticou a interferência das doulas no trabalho do obstetra e disse que era preciso seguir uma hierarquia na sala de parto. Fernandes assume em janeiro a presidência da Febrasgo (Federação Brasileira das Associações de Ginecologia e Obstetrícia).

“Em uma orquestra, o cara que toca bumbo é fundamental. Mas há um maestro –embora também o maestro tenha fama de arrogante”, disse ele na entrevista.

Ana Cristina Duarte, coordenadora do Gama (Grupo de Apoio à Maternidade Ativa), diz que há “regentes mais atualizados, que já adotaram um sistema de trabalho baseado na integração”.

“Até porque quem rege o parto não é o médico, é a mulher. Enfermeiras e doulas não são submissas ao médico nem têm que obedecer posição de hierarquia”, escreveu ela no Facebook.

Segundo ela, Fernandes demonstrou pouco conhecimento sobre o trabalho das doulas _ele disse que doula não era profissão, era acompanhante,  e entre suas funções estava acalmar, cantar musiquinha e passar óleo na barriga da grávida.

“A doula é uma profissão que não precisa de conselho, pois não toma decisões em saúde. Isso não a impede, tanto quanto o acompanhante e a própria mulher, de perguntar o que é que tem dentro dessa bolsa de soro que estão injetando na mulher”, afirma ela.

Melania Amorim, obstetra e professora da Universidade Federal da Paraíba, também questiona a familiaridade de Fernandes com o trabalho das doulas. “Todo mundo está careca de saber que doula não presta assistência, não interfere na conduta. Se não sabe, deveria se informar.”

Sem citar diretamente Fernandes, a obstetra e professora da UFSCar Carla Andreucci Polido, diz que ainda há médicos que se sentem ameaçados pelo trabalho das doulas. “Alguns médicos acreditam que são autoridades no parto, quando na verdade deveríamos ser os socorristas, os que acorrem e atendem as complicações”, escreveu.

Para Carla, “se existe hierarquia na assistência obstétrica, a chefe suprema é a mulher”. “Entender essa questão é muito mais importante do que marcar território e bater de frente com outros profissionais envolvidos no cuidado. Reconhecer a autoridade da mulher não é se submeter ou se curvar a ela com humildade. Ao contrário, é uma forma até egoísta de conseguirmos nossos melhores resultados profissionais.”

Melania diz que “o parto não deve se transformar em um ringue de batalha e tampouco requer comandantes, generais, brigadeiros ou maestros”. Em sendo um evento biopsicossocial e espiritual, demanda atendimento transdisciplinar e não discussões e brigas que se perdem na fogueira das vaidades. ”

Para o obstetra Ricardo Herbert Jones, a entrevista mostrou a importância que as doulas ganharam. “Alguém poderia imaginar há 10 anos que a doulas fossem o tema central numa entrevista com o líder máximo dos obstetras brasileiros? Isso mostra que as doulas são o que houve de novo no cenário da obstetrícia mundial”, escreveu ele.

No entanto, ele entende que as doulas  não devem interferir no trabalho dos médicos. “Doulas não são (pelo menos ainda) profissionais do parto, mas auxiliares da gestante e não podem interferir nas condutas. Doulas dever sem discretas e silenciosas, sempre. O confronto com as autoridades médicas ou de enfermagem não ajuda as doulas, muito menos as mães e seus bebês.”