Curso de desprincesamento em SP quer mostrar às meninas que elas podem ser o que quiserem
Sua filha gosta de brincar de princesa? Tudo bem, não tem nada de errado nisso. O problema é tentar impor às meninas um modelo de comportamento repleto de regras, etiquetas e convenções sobre o papel da mulher na sociedade. Para se contrapor a esse padrão, a jornalista Mariana Desimone e a filósofa e pedagoga Larissa Gandolfo decidiram montar uma oficina de desprincesamento.
A ideia da oficina é uma reação à criação da escola de princesas, inaugurada em São Paulo em outubro. “A gente ficou com vontade de oferecer uma opção à escola de princesas. Ficamos tristes e indignadas com aquilo. Mas só indignação não leva a nada. Você pode continuar indignada e nada vai mudar. Decidimos propor algo diferente”, afirma Mariana.
E o que as incomodou na Escola de Princesas? Para começar, o próprio site da escola, que diz que todo sonho de menina é tornar-se princesa ou que o casamento é o passo mais importante na vida de uma mulher. “É muito grave dizer que o sonho de toda menina cabe na ideia de ser princesa. Acho sintomático da nossa sociedade, do lugar que espera que a mulher ocupe: ser princesa, ser dócil. A gente não é um pet, um bichinho de estimação que tem que ser dócil”, diz Mariana.
“Nossa contraproposta a isso é mostrar outros modelos, mostrar que a menina já é um ser completo. Ela não é a metade de uma laranja, uma panela sem tampa. E quando crescer, pode ser feliz e alcançar o sucesso nos seus próprios termos. O que é sucesso pra mim pode não ser para você. Por que oferecer só um modelo pra elas seguirem?”
Para montar as bases da oficina, Mariana e Larissa participaram do curso de capacitação on-line oferecido pelo Escritório de Proteção de Direitos da Infância, no Chile. Entre os módulos que serão discutidos na oficina estão: identidade da menina, questões estéticas, autodefesa, além da apresentação de outros modelos femininos.
Larissa afirma que elas não são anti-princesas. “Não temos nada contra enquanto ícones da cultura infantil. Nada contra brincar de faz-de-conta ou dar brinquedo de princesa. Nossa questão recai sobre a formação, de colocar essa menina como pequena mulher que tem obrigações domésticas, formas de se comportar à mesa, de se guardar para o príncipe encantado, esperar esse conto de fadas acontecer na vida dela.”
Para ela, essa construção ideológica é muito perigosa. “Provavelmente, vai fazê-la uma menina frustrada. Muitas vezes ela nem tem escolha, pois esse modelo foi apresentado tão cedo, e só isso, que ela acaba não podendo escolher outra coisa.”
E por que se desprincesar? Larissa diz que todo mundo tem direito de ser livre. “Não precisa ser princesa ou aquilo que outra pessoa impõe como modelo e que tem uma determinada função na sociedade. Elas podem ser livres para ser quem elas quiserem, independentemente de terem nascido mulheres.”
Para comunicar essas ideias para meninas de 9 a 15 anos, cada tema da oficina será apresentado em três etapas. Primeiro haverá uma provocação, depois uma atividade lúdica e, em seguida, uma reflexão.
“A primeira ideia é provocar as crianças com perguntas. A partir daí, propor uma atividade lúdica e depois refletir, pensando em construir uma nova ideia que não seja apenas a princesa como modelo de criança menina”, conta Larissa.
Cada oficina terá três dias de duração. A primeira começa no dia 4 de dezembro. No último dia, os pais são convidados a participar do debate. Veja mais informações na página da oficina de desprincesamento. O primeiro curso acontece em São Caetano, no ABC. Mariana diz que já há interessados para uma turma em São Paulo, mas ainda falta definir um local.
A empresária Renata Palmeira, que já deu uma festa inspirada no Homem de Ferro para a filha Marina, diz que a menina se incomoda com o rótulo de princesa.
“Na semana passada, a gente estava andando aqui na nossa rua, passamos pelas pessoas conhecidas e todos falavam: bom dia princesa! Chegamos no fim da rua, ela me parou e perguntou: mamãe, por que todo mundo só me chama de princesa e não me chama de herói? O que incomoda é essa divisão tão marcada de gênero que impede que meninas e meninos entrem em contato com o outro universo.”