Grupos virtuais são ‘ouvidos sem julgamento’ para muitas mães

São 3h17. Lá fora, o silêncio convencional da madrugada. “Tem alguém aí?”, pergunta uma mãe em um grupo materno no Facebook. Em segundos, nove outras mães respondem que sim. Todas estão amamentando seus bebês naquela hora e usam a página para interagir, tirar dúvidas, desabafar, evitar o sono ou simplesmente pra ouvir um “tamojunto”.

A maioria não se conhece, mas passa pela mesma situação e se entende. É o que diz Karla Machado, 33, mãe de Catarina, de cinco meses. Ela participa de um grupo da Casita. “A quantidade de experiências compartilhadas é gigante. Eu me sinto muito acolhida e, mais que isso, vejo que os bebês e as mães passam por situações muito parecidas”. Para Karla, a troca de informações é um caminho para o empoderamento das mulheres.

Karla carrega sua bebê Catarina no sling
Para Karla, os grupos são um caminho para o empoderamento materno (Crédito: Arquivo Pessoal)

 

Juliana Andrade, 34, conta ter usado os grupos virtuais para sanar muitas dúvidas sobre amamentação. Antes de escrever o questionamento, faz a busca pelo assunto e sempre acha respostas de quem já passou pelo mesmo problema. Mãe de Laura, 1, ela também participa de um grupo chamado “Mamães de setembro de 2016”. “Nele, todas as as crianças estão na mesma faixa etária e as dúvidas são quase as mesmas. É muito interessante”, avalia.

Juliana com a bebê no colo em frente ao personagem Woody, do Toy Story , em um shopping
Mãe de Laura, Juliana encontrou muitas respostas nos grupos virtuais de amamentação  (Crédito: Arquivo Pessoal)

Nenhum grupo substitui a opinião médica e isto está claro na maioria das regras quando as mulheres aceitam participar deles.

Criado em 2007, a comunidade  “Apoio Materno Solidário” começou com o objetivo de mobilizar doações de leite materno, mas em pouco tempo o grupo virou um ajuntamento de mães que além da amamentação, pediam orientação sobre o desenvolvimento dos filhos e trocavam figuras sobre a primeira infância.

Hoje são cinco grupos ativos que abordam parto, amamentação, volta ao trabalho e introdução alimentar. ao todo, 75 mil mães participam das comunidades, algumas delas de fora do Brasil.

“Recebo relatos tocantes, cheios de amor e agradecimento por ter feito a diferença na história da amamentação”, conta Simone de Carvalho, 42, idealizadora da comunidade.

Mãe de Nicholas, 1, Erika dos Santos, 34, (foto lá de cima), também recorreu aos grupos quando o filho deixou de comer. Percebeu não ser a única mãe nessa situação e se tranquilizou com confirmação médica de que a entrada na escolinha afetou o apetite do bebê. “Ali também sinto maior abertura para falar sem me sentir julgada, é um canal de desabafo também”.

Falando em desabafo, Janie Paula, criadora do “Buxixo de Mães” no Facebook, conta que é muito comum postagens sumirem no dia seguinte. “É um espaço pra desopilar o que incomoda, que permite falar insanidades e redimensionar problemas”.

Para ela, o fato de muitas mulheres preferirem desabafar com “desconhecidas” é totalmente compreensível, pois o fato de passarem ou terem passado pela situação gera empatia e identificação.

Mariana e Fernando
Mariana e o filho Fernando. “Experimentei os dois lados dos grupos virtuais”. (Arquivo Pessoal)

Nem só de abraços vivem esses grupos. Mariana Medina, mãe do Fernando, 1, procurou apoio quando o filho desmamou por conta própria. A mamada de despedida ocorreu no dia do primeiro aniversário do pequeno. “Fiquei desesperada, foi um luto. Não estava preparada para o desmame e ele ocorreu naturalmente. Simplesmente, ele não quis mais mamar”, explica a mãe, que desabafou em um longo texto. “Fiquei surpresa com as respostas. A maioria dizendo que eu havia feito algo de errado”, lamenta.

Postou o mesmo texto no grupo “Buxixo de Mães” e ao contrário do anterior, foi acolhida. “Ali, muitas mulheres indicaram grupos de apoio, relataram ter passado pela mesma experiência e me acalmaram. Percebi que não estava sozinha e que o luto passaria”.

Mariana lembra das histórias que a avó contava. “No passado, quando nascia um bebê, as avós, as tias e até as vizinhas ajudavam. “Hoje, é mais difícil. Acredito que essa rede virtual de apoio veio para suprir essa lacuna de apoio tão necessário para as mães”, completa.