Internado em outro hospital, pai vê nascimento do filho por Skype

Geralmente, quando um casal descobre a gravidez, é muito comum planejarem desde o quarto até qual tipo de parto desejam. Mas, e quando as coisas saem do controle e o planejado vai por água abaixo?

Foi o que ocorreu com a farmacêutica  Viviane Ferraz, 37. Ela e o marido, Mikael Rosquit, 46, moravam na Espanha e tentaram engravidar durante dois anos. Como não conseguiam, Vivane decidiu investigar o que estava ocorrendo. Foi durante uma consulta com um especialista em infertilidade que ouviu: “acho que você está no médico errado. Tem gente morando aqui”, disse durante o ultrassom.

A notícia da gravidez chegou com a comemoração de uma vaga de emprego em uma multinacional no Brasil.

Viviane avisou a empresa e sentiu segurança para voltar para o país e continuar empregada. Pode parecer óbvio, mas ainda é comum ouvirmos casos em que a mulher é dispensada por ter virado mãe.

Viviane chegou em junho e Mikael, que viria logo em seguida, sofreu um acidente de carro na Espanha. Ele só conseguiu chegar em outubro. “Quando me encontrou, eu já estava barriguda”, disse.

O casal optou por um parto normal hospitalar e se preparou para isso.

Detalhe: Mikael é sueco e não fala uma palavra em português. Em todas as consultas “ficava boiando”.

Após certa resistência, na 38ª semana de gestação, Viviane contratou uma doula, profissional que dá suporte emocional à gestante antes, durante e depois do parto. Ela não via a necessidade de contratar mais alguém para fazer algo que o próprio marido poderia fazer, imaginava a mãe.

Mariana Noronha, a doula escolhida, falava inglês e Mikael finalmente se sentiu incluído em todo o processo.

Quando Viviane completou 39 semanas de gestação, Mikael começou a passar mal. Sentia fortes dores no braço e no peito, além de muita falta de ar. Decidiu não preocupar a esposa e só contou na manhã seguinte que as dores, que achavam ser musculares, pioraram. Eles foram ao hospital. Passaram o dia lá. Diversos exames e uma suspeita foi levantada e depois confirmada pelos exames: tromboembolia pulmonar, quando uma artéria pulmonar fica bloqueada por um coágulo sanguíneo.

Mikael foi direto para a UTI e como não falava português, permitiram que ele ficasse com o celular para que a esposa fizesse a ponte entre ele e os médicos e enfermeiros.

“A despedida foi dolorida. O caso dele era grave e nãos sabíamos o que poderia acontecer. Ele chegou a dizer dizer que se algo ocorresse eu deveria buscar a cidadania sueca para o bebê e mudar para a Europa novamente. Eu não sabia se ele veria o filho nascer”, disse emocionada.

Em casa, Vivane tentou descansar um pouco, mas sua bolsa estourou. Ela havia sentido algumas dores ao longo do dia, mas a preocupação com o marido fez com que não percebesse que estava nos pródromos, aqueles sinais que indicam que o trabalho de parto está próximo.

Imediatamente escreveu no grupo de Whatsapp o ocorrido. Como não queria preocupar o marido, pensou em avisar a equipe interdisciplinar antes e avaliar o momento certo para contar para Mikael, que estava internado.

“Estudei muito e conversei com meu médico. Sabia que as contrações precisariam engrenar antes do bebê nascer”, contou.

Porém, ela não lembrou que o marido estava no mesmo grupo e que tinha acesso ao celular no hospital. Mikael ligou na mesma hora para Viviane.

FIQUE COM A GENTE

A doula Mariana, que atendia uma parturiente em outro local, foi para a casa de Viviane. “Quando entrei no quarto, a Vivi estava deitada, sozinha e sentindo muitas dores”, lembra Mariana. A mãe dela estava na casa também. Tinha ido cuidar dos cachorros, enquanto Viviane ficava no hospital com Mikael.

Acostumada atender as necessidades emocionais da gestante, a doula teve a sensibilidade de fazer uma chamada de Skype para que o pai acompanhasse tudo do hospital.

“Por que não incluí-lo no parto? Conectei o celular no carregador e para onde íamos, o Mikael ia junto”. Em cima do ar condicionado portátil ou na pia do banheiro, quando a esposa ia para o chuveiro aliviar as dores das contrações. Lá estava o Mikael”, lembra a doula.

“Fique com a gente”, disse para ele. “Apesar de não poder falar muito, ele estava atento e com um olhar muito amoroso, que certamente fez toda a diferença para a Vivi. Em todo tempo ela procurava o olhar dele no celular”, disse Mariana.

A parteira e o fotógrafo também chegaram. E as dores só aumentavam.

Decidiram, então, ir para o hospital. Mariana sempre incumbida de explicar tudo em inglês para o Mikael.

Enquanto o marido precisava passar por um procedimento, Vivi pedia anestesia. Mikael digitou para a doula, perguntando se estava tudo bem com ela, pois percebia que ela estava sentindo muita dor.

Após a avaliação, o obstetra disse que o mais indicado era uma cesárea, por causa de uma desproporção cefalopélvica. Seguiram para outra sala. Como Mikael não estava, Mariana entrou como acompanhante. Na verdade, com Mikael nas mãos, sempre online.

“Ainda bem que eu contratei a Mariana”, conta Viviane. Naquele momento, tudo o que eu planejei tinha mudado e ela, de mãos dadas comigo, foi fundamental para que eu me acalmasse e controlasse a ansiedade. Além disso, ela se preocupou em manter o Mikael na linha todo o tempo”.

IT´S A…

O casal optou por não saber o sexo do bebê durante a gestação, então logo que o viu, Vivi gritou para o pai: “It´s a boy! It´s a boy! ” (É um menino! É um menino!). “A sala inteiro se emocionou”, lembra Mariana.

Tor nasceu em uma sexta-feira, dia 1 de fevereiro, pesando 4,040kg e com 51,5cm.

“Foi muito difícil receber a notícia de que meu quadro era grave e que eu corria risco de vida. Havia a possibilidade de eu não conhecer meu filho. Fiquei muito triste em saber que ela entrou em trabalho de parto e eu não estava ao lado dela. Foi duro aceitar isso”, contou Mikael.

ENCONTRO

Mikael ficou internado na UTI por dois dias. Ao ser transferido para o quarto, os médicos permitiram que ele recebesse alta para conhecer o filho em outro hospital.

O encontro ocorreu no domingo, dia 3 de fevereiro.

“Levei algum tempo para superar que perdi o nascimento, mas tive a sorte de estar lá pelo menos em vídeo. Foi tão bom ver a Vivi sorrir quando o colocaram no peito”, lembra o pai.

Mikael foi diagnosticado com uma mutação rara, responsável pela coagulação do sangue. Ele está bem, mas precisará tomar anticoagulantes por toda a vida.

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