Feminismo se esqueceu das mães pelo caminho, diz autora
Metade das mulheres empregadas no Brasil deixam seus trabalhos um ano após o início da licença maternidade. Sabe o que isso significa? Que elas foram demitidas ou tiveram que pedir demissão por não encontrarem flexibilidade nos empregos para continuarem produzindo e cuidando mais de perto dos filhos. Também há mães que decidiram ficar em casa sem essas pressões externas, mas certamente, são minoria da minoria.
A jornalista Nathália Fernandes entrou para essa estatística, que é um fenômeno global: no mercado de trabalho, a presença de mulheres com um filho é brutalmente mais baixa, enquanto o nascimento de um filho não afeta muito pouco a vida profissional de um homem.
Sua experiência está relatada no livro “Feminismo Materno – O que a Profissional Descobriu ao se Tornar Mãe” (Pólen Livros), que será lançado nesta quarta-feira (11), em São Paulo.
A reviravolta em sua vida aconteceu após o nascimento de Sofia, há cinco anos. Ao retornar ao trabalho, em uma empresa brasileira em Londres, a jornalista pediu apenas um dia para trabalhar de casa. A ideia era que seu marido também conseguisse outro dia e a filha ficasse na creche apenas três vezes por semana.
Pela sua experiência, o dia solicitado era o mais tranquilo e ela conseguiria dar conta das demandas profissionais, enquanto estivesse em casa, mais perto da filha.
“A resposta para o meu pedido, no entanto, veio mais rápido do que eu esperava, e era mais seca do que eu poderia prever. Segundo meu chefe direto, ele pouco havia podido fazer. Era uma decisão dos seus superiores, ele me disse. Não haveria mudança alguma, negociação alguma. Eu, então, reagi mal, porque ainda tinha esperança. Acreditava que minha experiência seria valorizada. Acreditava no meu valor como profissional e esperava que esse valor os trouxesse à mesa de negociação. Me enganei”, conta a autora.
A recusa da chefia fez com que Nathália colocasse na balança se valeria a pena ver a filha apenas duas horas por dia, mantendo o padrão financeiro e o prazer de trabalhar em algo que ela se sentia realizada ou se estaria próxima da primogênita, abrindo mão também de uma sólida formação acadêmica (estimada em R$ 400 mil reais).
Ela conta que chegou a se questionar se o vínculo com a filha não era exagerado. “Ao não receber contraproposta alguma, apenas a sinalização de que toda e qualquer negociação estava encerrada, tornou-se extremamente difícil seguir acreditando que deveria manter um emprego que, por mais que gostasse, parecia insistir em fechar portas e não em buscar soluções”, relata.
Ao redor do mundo esse fenômeno é chamado por muitos autores de “hemorragia”: quando há a saída silenciosa de mulheres altamente qualificadas dos trabalhos após a maternidade.
Em seu livro, Nathália, que também é mãe de Luca, 2, não defende que os pais fiquem integralmente em casa com os filho, afinal, aqui não é a Croácia (que oferece 410 dias de licença). O que a autora propõe é que haja pelo menos a abertura para a discussão de um novo modelo.
“Para o sistema econômico vigente, priorizar temporariamente o cuidado com as crianças é sinônimo de fracasso ou falta de profissionalismo”, diz Rute Bersh, da Rede Maternativa, que também participa da publicação.
A pesquisa citada no início desse texto é um levantamento de 2016 da FGV, um dos diversos respaldos teóricos que Nathália usou para embasar sua obra. Filmes, livros e pesquisas confirmaram que o problema é sistêmico. “Não sou eu que estou errada e a pesquisa me ajudou a ver isso”, diz.
CRÍTICA
Para Nathália, a principal vertente do feminismo, que garantiu a entrada da mulher no mercado de trabalho, deixou as mães pelo caminho. “O jeito era se tornar um homem e exigir um comportamento masculino, sem reconhecer a força do feminino”, pontua. Ela diz ter descoberto ser feminista ao ver que sua luta era essencial para sua felicidade e não fazia o menor sentido para seus antigos chefes.
“Não queria apostar, correr risco de deixar minha filha. Hoje vejo que consegui dar uma base sólida para os dois e isso me deixa mais tranquila”, conclui a jornalista, que hoje é dona de uma microempresa de conteúdo e marketing digital.
“Feminismo Materno – O que a Profissional Descobriu ao se Tornar Mãe“
Lançamento dia 11 de setembro, na Livraria da Vila, das 15 às 17h.
Rua Fradique Coutinho, 915, Pinheiros, São Paulo.