Introdução alimentar: não estamos prontos para aceitar o não de um bebê
Que atire o primeiro brócolis quem nunca se preocupou com a introdução alimentar do seu filho.
O que dar? De que forma? Quanto oferecer e como lidar com a frustração após seu pequeno jogar no chão todo alimento que você passou a manhã preparando para ele devorar feliz.
Quando atende mães e pais nesta fase, a nutricionista materno-infantil Carla Massuia bate sempre na mesma tecla: o enfoque da introdução não é comer, mas ter a oportunidade de conhecer os alimentos.
“Somos de uma geração ensinada a raspar o prato a todo custo e muitas vezes esperamos que nossos filhos comam tudo que é oferecido para eles, mas não há ninguém que goste de tudo”, afirma a especialista.
Ela pontua que os pais se esquecem de que o ato de comer vai se repetir muitas vezes ao dia até o final da vida, e quanto melhor for a relação da criança com o alimento logo no começo, melhor será a relação para o resto da vida.
“Quanto maior guerra para comer, maior será a recusa. Ninguém é feliz comendo a qualquer custo”, diz a nutricionista. Ela também elenca diversos problemas alimentares na vida adulta com os traumas causados durante a alimentação na infância.
A nutricionista, que também é mãe de Mário, de 1 ano, é adepta do método BLW (do inglês Baby Led Weaning ou desmame guiado pelo bebê), aquele em que os pais colocam a criança em um cadeirão e oferecem na bandeja alimentos que ele pode comer usando as mãos. O intuito é estimular o bebê a conhecer diferentes texturas e comer o quanto quiser, na velocidade que desejar.
A principal fonte de nutrição da criança dessa fase ainda é o leite materno ou a fórmula, então a comida é apenas um complemento para eles nessa fase.
MAS, E A SUJEIRA?
Mesmo que você opte por outro método, certamente alguma sujeira vai ter que encarar, afinal, os bebês estão aprendendo e acidentes podem acontecer (leia comida na roupa, no cabelo ou pratos voando por causa das mãozinhas ágeis deles).
Caso a sujeira seja um impeditivo para experimentar o BLW, Carla Massuia indica o contato com alimentos mais secos, como cenoura ou quiabo, e sugere ao menos uma refeição no estilo, pelo menos uma vez por semana.
“Nossas mãos têm receptores de reconhecimento e ao usá-las para comer, as crianças treinam a coordenação motora, criam intimidade com o alimento e exploram sua cavidade oral. Bebês que reconhecem o que comem ficam mais confortáveis e se alimentam melhor”, diz.
Vale lembrar que nós adultos adoramos apalpar as coisas antes de comprar (seja uma fruta, um livro ou uma roupa). “Com as crianças é igual. Permitir essa experiência, nem que seja uma vez na semana, vai desenvolver habilidades e ampliar o repertório durante a fase oral, que vai até os 18 meses”, completa.
ENGASGO
Quando mama, o bebê faz um tipo de movimento com a língua. Ao começar a comer, a língua passa a lateralizar a comida e jogar o alimento para ser amassado no céu da boca. Para evitar engasgos, os bebês nascem com um mecanismo de defesa chamado reflexo de GAG. É uma ânsia que ele pode apresentar durante a introdução alimentar e que evita que a comida desça de uma vez.
Ao ofertar alimentos para as crianças, os pais devem cortá-los de forma a evitar o engasgo, principalmente os esféricos, como tomate cereja e ovo de codorna (veja mais dicas de cortes de segurança abaixo). Nunca ofereça comida quando o bebês estiverem reclinados, na cadeira de balanço ou deitados. E lembre-se que não são só os sólidos que causam engasgos.
Uma criança nunca deve comer desassistida, principalmente no início. Os pais ou cuidadores devem estar de frente para a criança e com a atenção voltada totalmente para ela. Vale a pena aprender manobras de desengasgo (melhor pecar pelo excesso).
RECUSA
Aos pais cabem três coisas: definir onde a criança vai se alimentar, o que ela irá comer e que horas será a refeição. Evite comer na frente da TV ou sair atrás da criança com o prato na mão. O ideal é sentar-se à mesa e comer junto com os filhos.
A decisão sobre qual alimento dar é de responsabilidade dos adultos, portanto, o filho pode escolher o que quer comer desde que as opções tenham sido dadas pelos pais.
A sensação de previsibilidade traz segurança para os pequenos, por isso, busque ter uma rotina básica, com horários para se alimentar.
Já ao bebê cabe definir a quantidade de alimento, e se vai ou não comer. Afinal, o estômago é dele e o gosto também. “Não estamos prontos pra aceitar o não de um bebê. Fomos criados para comer a todo custo, achando que criança não tinha que querer. Temos uma grande oportunidade de reverter isso, respeitando a escolha dos nossos filhos”, afirma a nutricionista, que atende famílias há 12 anos.
Para tornar esse processo mais leve, a especialista dá mais dicas:
- Para o bebê poder iniciar sua aventura com a comida, é necessário que tenha pelo menos 6 meses e que dê sinais de aptidão para iniciar sua jornada: demonstrar interesse pelo alimento, sustentar o tronco e coordenar o movimento mão boca. Isso pode acontecer no dia em que ele faz 6 meses ou não.
- A partir daí, podem ser ofertadas todas as frutas, vegetais, cereais (como arroz, aveia, trigo), proteínas de origem animal (ovo, carne, peixe, frango). Neste início, o bebê não precisa de sal e nem de leite de vaca e derivados.
- Açúcar deve ser evitado até os 2 anos de vida.
- Em geral, essa fase é próxima ao nascimento dos dentes, o que já causa um enorme desconforto para o bebê. Há casos em que a introdução alimentar coincide com o retorno da mãe ao trabalho, então a descoberta pode ser ainda mais angustiante para eles nesse momento, assim como para seus pais. Paciência é a palavra chave.
- Ofereça alimentos recusados em novas formas e com outros temperos. No caso de uma recusa recorrente, nunca engane a criança, incluindo esse alimento escondido para forçá-la comer. Isso pode refletir na recusa de mais alimentos.
- Comer junto com o bebê e de preferência a mesma comida (apenas temperadas de forma diferente), traz ainda mais confiança para a criança.
- Fuja dos mitos e palpites sem base científica. Bebês podem comer todos os tipos de banana, maçã e laranja.
- Ofereça bastante água ao longo do dia.
- Não há problema algum em repetir as refeições. Nosso filho precisa da gente mais inteira possível. Se um brócolis congelado permitir ter mais tempo com seu filho, vá em frente.
- O bebê é exatamente igual a gente: gosta de comida bonita, gostosa, cheirosa e apetitosa. Bote em jogo a boa e velha refoga de alho com cebola, aproveite e já use a salsinha, alecrim, azeite, coentro (há controvérsias), cúrcuma e mais um monte de temperos naturais.
- Aos maiores, deixem participar da rotina da alimentação, permita que pegue os alimentos antes do preparo, que lavem as frutas e verduras
- Já dizia o ditado: O ladrão de felicidade é a comparação. Cada bebê tem um tempo e um gosto. Relaxe e procure focar em estar com a criança no processo. Comer vai muito além do nutrir o corpo.
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