Maternar https://maternar.blogfolha.uol.com.br Dilemas maternos e a vida além das fraldas Fri, 03 Dec 2021 15:35:24 +0000 pt-BR hourly 1 https://wordpress.org/?v=4.7.2 Acupuntura em grávidas atua desde enjoo até em virar o bebê para o parto https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/09/24/acupuntura-em-gravidas-atua-desde-enjoo-ate-em-virar-o-bebe-para-o-parto/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/09/24/acupuntura-em-gravidas-atua-desde-enjoo-ate-em-virar-o-bebe-para-o-parto/#respond Fri, 24 Sep 2021 16:22:02 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2021/09/WhatsApp-Image-2021-09-23-at-16.39.09-320x213.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=9298 Cada dia mais se debate a importância das práticas integrativas nos desfechos positivos da gestação e do parto.

Reconhecida oficialmente em 2017 na lista de tratamentos oferecidos pelo SUS (apesar de ser usada desde a década de 80), a acupuntura é uma dessas práticas e ganha espaço entre as grávidas porque substitui, por exemplo, o uso de anti-inflamatórios –proibidos durante a gestação.

Durante a sessão, as agulhas estimulam as terminações nervosas existentes na pele e nos tecidos subjacentes e o “recado” gerado por esses estímulos segue pelos nervos periféricos até o sistema nervoso central onde são liberadas diversas substâncias químicas conhecidas como neurotransmissores, que desencadeam a analgesia na mulher, atuam como anti-inflamatório, relaxante muscular ou sedativo.

“As agulhas também podem agir sobre o sistema endócrino, imunológico e como moduladora sobre as emoções”, explica Roberta Girelli, médica especializada em acupuntura. Ela cita desfechos positivos em casos de cólicas no início da gestação, enjoos, vômitos, depressão, ansiedade, insônia e constipação intestinal.

“Durante as primeiras sessões percebi uma nítida melhora na ansiedade e mais para o fim, fiz sessões para a Olívia virar [estava pélvica] e deu certo [ficou cefálica]”, conta Julia de Santi, 36, que conseguiu ter a filha de parto normal após a cesárea do primeiro filho.

Acupuntura ajudou a amenizar os enjoos de Julia e aposicionar a bebê para o parto (Arquivo Pessoal)

Ela conta que após a bolsa romper chamou a acupunturista em casa e a ação das agulhas ajudaram a engrenar o parto.

Mãe de dois meninos, Viviane Guizelini, 44, também buscou ajuda na primeira gestação para diminuir os enjoos, problemas musculares, ansiedade e alergias. “Tratei rinite alérgica e o resultados era imediato, ao ponto de entrar na sessão com coriza e sair sem desconforto e sem o nariz estar escorrendo”, lembra. Na segunda gravidez, Viviane não conseguiu fazer sessões de acupuntura e notou mais incômodos durante a gestação.

“Os incômodos foram mais evidentes. Tive contrações de treinamento a partir da 26ª semana e também muita pressão no períneo, além de dor nas costas. Era uma mistura de queimação com algo ‘rasgando’ por dentro. A acupuntura fez muita falta”.

Presentes no histórico de muitas mães, cefaleia, lombalgia e síndrome túnel do carpo também podem ser tratadas com as agulhas.

Essa liberação de substâncias de forma endógena (produzidas pelo próprio organismo) é uma opção segura em todas as fases da gravidez, mas deve ser feita por profissionais especializados e com aval dos médicos que companham essa mulher no pré-natal.

Gestantes com distúrbios de coagulação ou anticoaguladas precisam de mais atenção e é preciso atentar para o que os antigos livros da medicina tradicional chinesa chamam de ‘pontos proibidos’, porque alguns deles estimulam a contração uterina.

Viviane e os filhos Vitor e Antonio (Lente Materna Fotografia/Arquivo Pessoal)

 

“A acupuntura, como qualquer tratamento, não promete exclusividade. Pelo contrário, a colaboração do paciente é essencial ao bom andamento de qualquer opção terapêutica”, destaca Silvana Maria Fernandes, acupunturiatra do Centro de Medicina Integrativa do Hospital e Maternidade Pro Matre.

Silvana cita a correção de hábitos alimentares a ingestão equilibrada de líquidos, um sono regular e prática de exercícios físicos adequados a cada fase gestacional como complementares ao tratamento.  “Tratar ou equilibrar comorbidades, de preferência antes de engravidar e controlar as condições emocionais também são aspectos relevantes abordados na consulta inicial, onde uma anamnese completa deve ser realizada, levando-se em conta todo o histórico médico da paciente, incluindo corpo e mente”, explica.

A literatura também apresenta bons resultados da acupuntura no pós-parto, em distúrbios da lactação (hipogalactia) e em quadros de depressão.

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Quer desmamar seu filho? Sinais ajudam a reconhecer o melhor momento https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/09/09/quer-desmamar-seu-filho-sinais-ajudam-a-reconhecer-o-melhor-momento/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/09/09/quer-desmamar-seu-filho-sinais-ajudam-a-reconhecer-o-melhor-momento/#respond Thu, 09 Sep 2021 13:50:43 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2021/09/WhatsApp-Image-2021-09-08-at-12.49.25-6-320x213.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=9269 Assim como sentar, andar, correr ou falar, o desmame deve ser encarado como um processo e não um evento.

Partindo desse princípio, nenhuma criança anda ou fala antes de estar pronta e nenhuma deveria ser desmamada antes de estar madura para isso.

literatura não crava uma idade certa, mas aponta maturidade quando a criança aceita outras formas de consolo, permite não ser amamentada em certas ocasiões, consegue dormir fora do peito e prefere outra atividade a mamar. Além disso, não demonstra ansiedade quando o peito é recusado e tem uma alimentação variada estabelecida.

Aguardar os sinais do desmame nem sempre é fácil para todas as mulheres. Há crianças que acordam mais vezes durante a noite para mamar ou demoram para aceitar o fim da amamentação. Há um cansaço invisível e muitas antecipam o processo.

A OMS recomenda amamentar até os dois anos ou mais, e se uma mãe chegou nessa fase da vida, ela tem muitos motivos para comemorar, afinal o Brasil em 2020 apresentava a média de apenas 54 dias de amamentação exclusiva no peito.

Amamentar exclusivamente por seis meses e seguir amamentando até os dois anos, infelizmente, ainda é um privilégio em nosso país.

Especialistas no assunto orientam desmamar de forma gradual, em uma momento tranquilo da vida da criança, ou seja, sem estar enfrentando outras mudanças drásticas como início da vida escolar, chegada de um irmão ou desfralde. É preciso paciência, porque desmamar pode ser imprevisível e até doloroso para mãe para o filho.

Vale lembrar que desde o nascimento o peito é um local de aconchego, segurança e descanso para o bebê. É o maior porto seguro dele, além de fonte de alimentação, é claro.

Quando Jean* completou dois anos, a empresária Fabiana* decidiu começar o processo de desmame. Leu muito sobre o assunto, fez curso de desmame gentil e aos poucos foi aplicando o que aprendeu na consultoria.

“Sou superativista e pró-amamentação, queria que fosse algo suave e tranquilo igual a tantos relatos que a gente lê na internet, mas não foi tão simples assim”, conta a mãe.

A única “vitória” no processo foi conseguir desvincular o peito do sono do filho, mas no restante do dia, incluindo as madrugadas, o menino demandava muito.

“Quando ele me via já corria pro peito. Ele mamava sempre que estava comigo. A situação estava, na minha opinião, descontrolada”, diz.

Fabiana decidiu parar de ofertar de uma vez, oito meses após o início do processo. “A gentileza já tinha ido pro espaço. Acabei indo por um caminho considerado errado e foi um processo doloroso emocionalmente, que faz com que até hoje eu me sinta culpada pela forma que ele aconteceu”, desabafa.

Já para Mayara Freire, 30, desmamar não estava nos planos, mas Estêvão, de dois anos e sete meses começou a dar os primeiros sinais de que esse tempo está chegando.

Grávida de 5 meses, Mayara conta que surgiram fissuras em seus peitos e ela percebeu que a quantidade de leite também diminuiu.

O filho já ficou três dias sem mamar e inclusive disse que “o tetê agora é do neném”, referindo-se ao bebê que está na barriga. “Nós nunca falamos nada sobre isso com ele. A última vez que mamou foi bem rápido, só um aconchego antes de dormir”, conta a mãe. “Acredito também que o gosto do leite tenha mudado”, observa.

Segundo a pediatra Kelly Oliveira, Mayara tem razão. O leite materno pode sofrer alterações no sabor e na quantidade quando a mãe está grávida novamente.

Na maior parte das vezes é possível amamentar estando grávida. Essa condição é chamada de lactogestação.

“O cuidado maior nesses casos são os aspectos nutricionais da mãe, que devem ser acompanhados de perto. Quando a gestação é de risco, aí então o desmame pode ser considerado”, diz a consultora internacional de amamentação pelo International Board of Lactation Consultant Examiners (IBLCE).

Outra forma possível é a amamentação em tandem, quando a mãe oferece o peito para crianças de idades diferentes. A orientação do ginecologista e obstetra também é imprescindível para esses casos.

Kelly não recomenda desmamar de um dia para o outro. “Desmamar de forma abrupta pode trazer consequências negativas para o bebê, principalmente gerar traumas e recusa de alimentos”.

A orientação da especialista é estipular combinados e conversar muito com a criança, cumprindo os combinados para que ela sinta segurança no processo. “Se a mãe define o desmame e volta atrás, a criança ficará confusa, sem saber o que esperar”, explica.

Para a mãe, é importante fazer ordenhas de alívio, retirando leite quando o peito estiver mais cheio. Isso evitará problemas como mastite e fará com que o corpo pare aos poucos de produzir leite. 

*Nomes trocados a pedido da entrevistada

MASTERCLASS

Pais que desejam mais informações sobre desmame gentil podem participar de um evento online e gratuito no YouTube da Pediatria Descomplicada na próxima quinta-feira (9), às 20h30.

A pediatra Kelly Oliveira, consultora internacional de amamentação pelo International Board of Lactation Consultant Examiners (IBLCE), Alergista e Imunologista pela Associação Brasileira de Alergia e Imunologia (ASBAI) dará uma aula sobre como desmamar sem romper o vínculo com a mãe.

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Colar de âmbar não alivia dores, aponta pesquisa https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/09/03/colar-de-ambar-nao-alivia-dores-aponta-pesquisa/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/09/03/colar-de-ambar-nao-alivia-dores-aponta-pesquisa/#respond Fri, 03 Sep 2021 12:29:25 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2021/09/WhatsApp-Image-2021-09-02-at-13.19.56-320x213.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=9249 Querido entre muitos pais, o colar de âmbar é vendido como calmante natural, anti-inflamatório e analgésico. Famosas como Isis Valverde, Karina Bacchi e Gisele Bündchen também são adeptas ao objeto, que é feito de resina vegetal fossilizada da região báltica.

A alta concentração de ácido succínio promete atuar sobre cólicas, instabilidade no sono infantil, alergias e incômodos durante o nascimento dos dentes.

Porém, uma pesquisa jogou um balde de água fria nessas crenças. A publicação da revista Altern Complement Med não encontrou evidências que sugiram que o ácido succínico possa ser liberado dos grânulos para a pele humana.

Além disso, os pesquisadores Michael Nissen, Esther Lau, Peter Cabot e Kathryn Steadman também não encontraram evidências que sugiram que o ácido tenha propriedades anti-inflamatórias.

Mãe de oito filhos, a doula e educadora perinatal Laura Muller acreditava nas promessas de calmaria do colar que ganhou de presente. Usou o enfeite em sua segunda filha, Margot, 5, a partir do terceiro mês.

Ela diz que acreditava nos “efeitos visíveis” do colar, porém “Margot vivia no peito, aconchegada no colo ou no sling”, lembra a empreendedora digital.

“Nunca foi o colar, sempre foi meu colo”, reconhece Laura, que, inclusive, foi quem divulgou essa pesquisa em suas redes sociais.

“Erramos tentando acertar. O desespero e a exaustão fazem isso com a gente”, diz.

“Falam muito sobre as dores de cólica ou dos dentes, mas se esquecem de que os saltos e picos de crescimento também alteram o sono e o comportamento do bebê. É sempre mais fácil associar essa mundaça a algo errado do que a um processo fisiológico e natural que se resolve sozinho”, afirma a doula criticando o mercado que vende soluções rápidas para as famílias.

Mãe de Pedro, 1, Christine Dias, 31, atribui ao colar o fato de seu bebê ser tranquilo e não ter sofrido com cólicas ou dores durante a dentição. Ele passou apenas por leves alterações no sono, mas sem febre ou diarreia –comuns aos bebês nessa fase.

“Não consigo dizer se foi o âmbar ou não, não tenho como provar que foi ele, mas vou continuar usando”, afirma a mãe.

RISCOS

Em 2019, a agência feral americana FDA (Food an Drug Administration, espécie de Anvisa deles) emitiu uma advertência sobre o risco que colares, pulseiras ou tornozeleiras representavam para bebês e crianças pequenas.

No documento, os riscos apontados são de mortes por estrangulamento e engasgo.

Casos os pais ainda queiram usar a joia, pediatras não recomendam usá-la sem supervisão, durante a noite ou quando os filhos estejam sentados no banco traseiro do carro, sem adultos por perto.

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Clareza sobre nossas feridas evita ferimentos emocionais nos filhos https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/08/31/clareza-sobre-nossas-feridas-evita-ferimentos-emocionais-nos-filhos/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/08/31/clareza-sobre-nossas-feridas-evita-ferimentos-emocionais-nos-filhos/#respond Tue, 31 Aug 2021 14:13:15 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2021/08/WhatsApp-Image-2021-08-31-at-12.31.19-320x213.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=9208 Ter clareza das nossas dores emocionais é o melhor caminho para não repeti-las em nossos filhos. Esse é um dos pilares da Teoria do Apego, que defende a criação segura para que a criança se desenvolva plenamente em todas as áreas.

Pais que apanharam na infância tendem a agir de forma violenta com seus filhos. Lembrando que gritos, ameaças, castigos e até o silêncio, ao ignorar um pedido de ajuda são considerados violência também.

Esse comportamento ocorre porque os pais repetem o padrão que receberam no passado. É o mais familiar e o que está internalizado dentro deles, independentemente de ser o melhor, é o conhecido e o mais fácil de ser acessado, explica a psicóloga e especialista em Teoria do Apego Arieli Groff.

Para encerrar esse ciclo, ela defende o autoconhecimento. “Não tem mágica, receita pronta ou rápida para isso. E isso requer coragem, disponibilidade interna, entrega e amor”, diz a especialista que lançou o livro “Quando uma Mãe Nasce: Confissões, Dores e Amores da Maternidade” (Editora Pirililampos).

Na obra, a autora aborda assuntos caros à maternidade, como raiva dos filhos, saudade da vida de antes, solidão e o cansaço mental por ter que tomar todas as decisões relacionadas à criança.

Dividido por assuntos, numa espécie de diário, Arieli também fala sobre a convivência forçada durante a pandemia, o dia da primeira birra pública e a fuga para o banheiro na expectativa de ter apenas um minuto de silêncio –o sonho de toda mãe.

“Minha filha tem minha melhor versão em vários momentos. Mas não é brincando de boneca”, revela a psicóloga destacando o mito da mãe perfeita. “Não somos boas em tudo. E não devemos nos cobrar isso. É cruel. É utópico”, afirma.

Reconhecer sentimentos, outro pilar da Teoria do Apego, aparece no capítulo “Hoje Tive Raiva”, onde ela ralata quando a filha a tirou do sério. “Ser mãe não me canonizou e ela ser minha filha não lhe dá o título de criança mais legal do universo. Ter raiva da minha filha foi o sentimento mais justo e honesto que pude oferecer. E eu disse o que estava sentindo. Nossa relação continua, com ainda mais verdade”, conta a mãe de Maitê, hoje com cinco anos.

“Criança pede presença. A cada comportamento difícil ou ataque de fúria nossos filhos estão nos dizendo ‘me olha’, ‘me ajuda’, ‘ não estou conseguindo sozinho’, ‘preciso de você’. É fácil amar quando ela está brincando de forma criativa e inteligente, de banho tomado, sendo meiga e dormindo como um anjo”, diz o livro.

No livro Quando Nasce uma Mãe, Arieli Groff fala sobre tabus na criação dos filhos (Divulgação)

O seu puerpério foi muito pesado? O que você sentiu e quanto tempo ele durou?

Ele não foi necessariamente pesado, mas me trouxe surpresas e vivências que mesmo já atuando com infância na clínica como psicóloga, eu não tinha clareza de como eram de fato vividos pelas mães. Me trouxe estranhamento e a angústia de por vezes não conseguir nomear o que eu sentia, e com isso, um sentimento de me ver só em tantos momentos, mesmo rodeada de uma rede de apoio afetiva e presente. Para mim foi aos dois anos da Maitê que senti e consegui retomar algumas questões mais voltadas a mim e conseguir me priorizar em algumas coisas. No final do primeiro ano eu senti um alívio do tipo “conseguimos, vivemos e sobrevivemos” e ao final dos dois anos dela veio esse sentimento de me ter de volta.

Por que a ideia de mãe perfeita faz tantas mães reféns?

Percebo que esse estranhamento que senti é também vivido por muitas mulheres, onde existe uma romantização de como é a chegada de um bebê e pouco se fala de sentimentos que não são vistos como positivos socialmente, como a tristeza, raiva, cansaço, questionamentos sobre a escolha de ter tido filhos, mas que se fazem presentes na realidade de muitas mães. E então quando a mulher sente isso, se percebe sozinha, inadequada, culpada de não sentir só amor e gratidão 24 horas por dia, que também estão presentes, mas não são exclusivamente o que se sente. E com isso, muitas mulheres se envergonham de compartilhar suas vivências, sentimentos, medos, cansaços, como se não tivessem o direito de reclamar. Acredito que esse é um aprisionamento que só iremos abrir aos poucos, com informação, diminuição da cobrança social em cima das mães e rede apoio, individual e coletiva, como sociedade.

Você conta sobre alguns momentos de fuga para cuidar de si, nem que seja no sofá para ter um tempo para ver uma série, ou no banheiro para fazer um xixi em silêncio. O quanto essas fugidinhas te ajudaram a não pirar ou levar a maternidade de forma mais leve?

Me ajudaram muito. Foram quase dois anos com a sensação que a minha vida não me pertencia mais, eu descansava enquanto trabalhava (atendimento em consultório). Esses pequenos momentos me traziam a sensação de ter o controle sobre alguma coisa, por menor que fosse, de que eu ainda tinha autonomia sobre meu tempo e espaço para escolher algo que fosse por mim e para mim.

Você assume que não gosta de brincar, que seu melhor é encontrado em outros momentos com a Maitê. Quando você descobriu isso e aceitou que brincar, algo tão importante para uma criança não era muito sua praia? 

Falo desse brincar mais tradicional, especialmente com meninas, que se espera que se brinque de bonecas, por exemplo, e que a mãe goste disso. Interagimos de outras formas, mas teve o tempo em que ainda me cobrei que precisava gostar de tudo que minha filha tivesse interesse em brincar. Até que entendi que aceitar quais eram as minhas brincadeiras favoritas e que eu não precisava gostar de tudo, me trouxe alívio e assim pude me entregar com mais prazer naquilo que gostava e até mesmo nas brincadeiras que não gostava muito, pois agora não havia cobrança, mas o amor de fazer algo pela felicidade dela.

Você fala sobre sentir raiva da sua filha em alguns momentos. Muitas mães têm medo de assumir isso e você fala com muita naturalidade sobre essa raiva. Alguma mãe já te deu feedback sobre sentir isso e estar aprisionada no medo das opiniões alheias sobre esse sentimento?

Muitas. Alguns sentimentos não são socialmente validados e tampouco valorizados. A raiva é um deles e se mostra como se fosse incompatível com a maternidade. Mas os sentimentos não são nem bons nem ruins, apenas são, o que fazem deles terem um aspecto mais positivo ou negativo é o que escolhemos fazer com eles, e isso vem de um lugar de consciência, autoconhecimento, empatia consigo mesma, o que leva a possibilidade de uma regulação emocional. Com isso, muitas mães me relatam que se sentem julgadas, culpadas, inadequadas e envergonhadas de assumirem o quanto seus filhos tantas vezes despertam raiva, aumentando o senso de solidão que leva à mais raiva. A raiva surge como a percepção de não se sentir vista, sem apoio, percebendo que chega em um limite e/ou quando se vê com recursos internos escassos para lidarem com os filhos. A raiva é uma expressão de cobranças externas e internas, frustrações e desamparos vividos pelas mães.

 O que a pandemia despertou de melhor em você como mãe ? E o pior?

 Ter minha filha 24 horas por dia em casa me fez agradecer por ter o privilégio de conseguir manter a rotina com ela e de trabalho (desde 2018 passei a atender somente online, e meu marido também já trabalhava home office, então já estávamos adaptados a esse modelo de trabalho), nos exigiu criatividade, readaptações, como todas as famílias, morávamos fora da nossa cidade, sem nenhuma rede de apoio (desde junho retornamos para Porto Alegre, morávamos em Florianópolis por uma escolha desde 2018 por mais qualidade de vida, mas a pandemia fez revermos prioridades e voltamos para mais perto da família e amigos daqui), mas ainda assim me fez agradecer pela vida que tinha, pelo privilégio da rotina que criamos e me fez também aproveitar mais os momentos com a minha filha. Ao mesmo tempo, precisei de mais “momentos de respiro”, mas aprendi a respeitar esses movimentos, entender quando meu melhor talvez fosse sair de cena, olhar para mim, me dar um tempo, e retornar podendo ser uma mãe o mais inteira possível.

Até que ponto sua filha pode ser ela e quando você “entra em cena” para evitar uma combinação de roupa que não acha adequada, ou fazer algo que não estava no script pelo fato dela ser criança?

Esse foi, e é, um grande desafio para mim. Sou opinativa, gosto de participar de escolhas e é uma nota mental que atualizo todos os dias, de entender que meu gosto, opinião, ponto de vista é somente uma única forma de entender e enxergar o que quer que seja, e não necessariamente a melhor, tampouco a preferida da minha filha, e que não é por ela ter cinco anos que a minha opinião precisa ter mais valor que a dela. Claro, há questões que aos cinco anos ela não tem sequer maturidade para decidir, e aí entendo ser meu dever entrar em cena. Mas em assuntos e situações que ela já possui autonomia pela idade para escolher, procuro incentivar que ela decida. Provoco ela a dizer o que prefere, o que gostaria. Isso vale para roupas por exemplo (desde que não queira sair fantasiada de sereia em um frio de 2ºC do sul) até para questões comportamentais. Quando se chateia ou nos desentendemos, procuro após estarmos emocionalmente mais estabilizadas, conversar com ela, perguntar se entende que a forma como reagiu foi a melhor, como poderia agir em uma próxima situação.

Muitos pais estão ao lado, mas não estão presentes na vida dos filhos. O que essa presença decorativa provoca no emocional das crianças ao seu ver?

Acredito que nada em nossa vida deva ser encarado como sentença, a capacidade de transformação é sempre possível, mas é fato que muitas das vivências da infância deixam marcas e influenciam no desenvolvimento emocional, construção de vínculos e relacionamentos futuros da criança. São várias as mensagens que podemos passar sendo uma presença ausente: fazer com que a criança não se sinta importante, gerar um entendimento que esse amor é condicionado (a criança perceber que é digna de atenção se faz determinadas coisas, por exemplo), gerar comportamentos intensos na criança como forma de chamar a atenção, apresentar dificuldades escolares para igualmente se sentir vista e com isso se desenvolverem adultos com um baixo senso de merecimento, que cultivam relacionamentos de submissão (sejam afetivos, de amizade ou no trabalho, com colegas e chefes) e por vezes expostas à violências (seja física, emocional e/ou psicológica), dificuldade de confiar nas pessoas e em si mesmos. Em termos de construção de vínculos, qualidade e quantidade importam.

Como os pais podem ter essa consciência que você diz necessária para criar sem aprisionar ou sem cometer tantos erros?

Autoconhecimento. Não tem mágica, receita pronta ou rápida para isso. E isso requer coragem, disponibilidade interna, entrega e amor, muito amor. Estudar sobre infância, educação, vínculos também é muito importante. Passamos a vida estudando para nossos trabalhos, por que temos a pretensão de achar que não precisamos estudar para a missão mais importante e de maior responsabilidade das nossas vidas? Além disso, poder se olhar com gentileza, empatia e a expectativa da busca pela perfeição, ela é utópica e cruel.

Por que vemos tantos pais repetirem os mesmos erros que juraram que não cometeriam com seus filhos?

O nascimento de um filho é como a abertura de um portal, onde nossos filhos nos catapultam a viver o afeto em sua máxima potência, pois conforme mostra a Teoria do Apego (a qual estudo e é a base teórica que permeia meu trabalho há 16 anos), a criança necessita se sentir segura e protegida para se desenvolver, isso é biológico e inato, e que em qualquer sinal de ameaça, liga seu comportamento de apego, solicitando esse amparo da figura principal de cuidado ( sendo essa ameaça real e legítima para quem a sente, podendo ser desde fome, frio até sentimento de solidão). Ao fazer isso, a criança muitas vezes pede aos pais algo que não receberam em suas próprias infâncias, tráz à tona dificuldades vinculares dos próprios pais, e então muitas vezes pais, com pouca clareza de suas dificuldades e com autoconhecimento não muito aprofundado, tendem a repetir o padrão que receberam, por ser o mais familiar e o padrão que está internalizado dentro de si, independente de ser o melhor, é o conhecido.

Psicóloga especialista em Teoria do Apego Arieli Groff, autora de Quando nasce uma Mãe (Arquivo Pessoal)

Trecho do livro: Nenhuma Novidade

“Especialmente nesse período de isolamento, me peguei pensando nas coisas que precisei abrir mão, seja para mantermos a saúde, seja porque nossa rotina mudou por aqui com Maitê 24 horas por dia em casa. Aí percebi que, por mais que tenha precisado de adaptações, não foi algo inédito.

Percebi que mãe quando vem a parir já abre mão de um monte de coisa. Quiçá já durante a gravidez. Ou pelo simples fato de sermos mulheres. Cursos de gestantes não deveriam ensinar como dar banho ou trocar fralda, tampouco fazer o desserviço de dizer que o bebê tem que mamar a cada 3 horas. Deveriam compartilhar mesmo “como abrir mão da sua vida e se manter sã”, “como se reconhecer após perder sua identidade”.

Deveria ser item obrigatório. Mas isso ninguém nos conta. Não é bonitinho, corrobora para manter as mulheres em uma posição de culpas e deveres como o patriarcado precisa. Enfim, esse tal patriarcado tem me tocado muito nos últimos tempos.

Mas voltando aos meus pensamentos, percebi que, de alguma forma desde meninas, somos ensinadas a sermos as boazinhas, as educadas, a ter modos de mocinha, a dizer amém para os outros e ainda rindo, a deixar nossos quereres de lado. Mas aí nos tornamos mães, e acredito que o que torna tão penoso nesse abrir mão de si mesma não são nossos filhos.

É a reedição de nos sentirmos, mais uma vez, como na nossa história, tendo que nos deixar de lado. Não é algo inédito. Nesse silêncio da casa, me vendo sozinha ainda, entendi que ser mãe não é somente sobre abrir mão de si, é sobre abrir espaços para permitir se transformar.

Deixar que o novo nos atravesse e faça morada. É autorizar trocar a roupa da alma e se preencher de sentimentos, vivências, pensamentos agora, sim, inéditos. E por isso, às vezes, tão assustadores que escolhemos fugir, nos proteger através de medos e reclamações.

Ser mãe é um ato de fé, é ter a coragem de se jogar no vazio e ser surpreendida por aquilo que ninguém nos conta e, ainda assim, seguir inteira, mas agora, de um outro jeito desconhecido. E aí o peso pode ir embora, por mais difícil que seja. O que fica é leveza e amor”.


 SERVIÇO

Quando uma Mãe Nasce: Confissões, Dores e Amores da Maternidade

Autora: Arieli Groff

R$ 45, Editora Pirililampos, 115 páginas.

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Chegada de um filho é uma situação traumática, mesmo quando tudo vai bem https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/07/17/chegada-de-um-filho-e-uma-situacao-traumatica-mesmo-quando-tudo-vai-bem/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2021/07/17/chegada-de-um-filho-e-uma-situacao-traumatica-mesmo-quando-tudo-vai-bem/#respond Sat, 17 Jul 2021 13:44:48 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2021/07/WhatsApp-Image-2021-07-15-at-14.40.04-320x213.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=9084 Para a psicanálise, a chegada de um bebê precisa ser entendida como uma situação traumática.

Isso ocorre porque a entrada de um novo membro na família é “potencialmente desorganizadora”, que pode deixar pais e mães assustados, sem conseguir produzir um sentido para tamanha mudança.

Em geral, a preocupação mais velada é a financeira. Como vou pagar os estudos? E as fraldas, as roupas, remédios e seu lazer? Mas a desorganização vai muito além.

Pai e mãe deixam de ser somente “filhinhos” e passam a ter um “filhinho”. Fora isso, o nascimento de um bebê revisita o passado, onde há traumas, dores e situações nem sempre tratadas.

O relacionamento dentro de casa muda: os planos, horários, saídas e as viagens também.

Porém, essa crise interna não é socialmente aceita, já que o filho é uma bênção e a ideia de trauma não combina com o anúncio feliz e a chuva de “parabéns” que os pais ganham quando contam a novidade para os amigos e familiares.

Só que ela é mais comum do que se imagina. Para quem reconhece em si esse trauma, a indicação é buscar ajuda, tanto de profissionais de saúde mental, quanto criar uma rede de apoio e compartilhamento.

“É absolutamente necessário que mãe e pai possam contar com um ambiente próximo que apoie, dê continência e tolere esse mal-estar inicial”, explica a psicanalista Rachele Ferrari.

No dia 29 de julho, a mestre em Psicologia Clínica pela PUC/SP e doutoranda em Psicologia Clínica pela USP vai comandar uma roda online gratuita para debater esse assombro e sua elaboração.

“É preciso renunciarmos ao idílio tão veiculado pelas mídias. Há delícias sim e muitas, mas também há dores que precisam ser ouvidas. Falar sobre essas dores e poder receber uma escuta empática é curativo, porque a experiência vai sendo nomeada, transformada e integrada como repertório da vida”, conclui a psicanalista.


SERVIÇO

Maternidade: assombro e elaboração

Dia 29 de Julho – gratuito (pelo Zoom)

 

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Dores, lágrimas e culpa: o que nem sempre te contam sobre amamentação https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/08/25/dores-lagrimas-e-culpa-o-que-nem-sempre-te-contam-sobre-amamentacao/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/08/25/dores-lagrimas-e-culpa-o-que-nem-sempre-te-contam-sobre-amamentacao/#respond Tue, 25 Aug 2020 16:31:10 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2020/08/WhatsApp-Image-2020-08-19-at-17.55.36-320x213.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=8960 Todo ano, a campanha #AgostoDourado fala sobre os benefícios de dar de mamar, fala sobre a importância da informação, da preparação ainda no pré-natal, sobre confusão de bicos, consultorias de amamentação e sobre rede de apoio.

Saber sobre tudo isso é essencial, mas não é garantia de sucesso no processo. E é isso que esse relato corajoso da minha amiga Dani Braga mostra. Mesmo bem informada, cercada por uma rede de apoio e de profissionais especialistas no assunto, ela vivenciou momentos muito doloridos no corpo e na mente para seguir em frente com a amamentação de seu filho.

“Embora eu reconheça o vínculo que se estabelece por meio da amamentação, posso dizer que aqui em casa o entrosamento não veio por meio dela, ao menos não apenas por essa via. Hoje, o amor pelo meu filho é imenso, ao ponto de sentir saudade de estar perto dele mesmo estando no cômodo ao lado, e amamentar deixou de ser um peso”, comemora a mãe do Ian, um dos bebês mais simpáticos que já conheci (virtualmente, por causa da pandemia, claro).


“Quando engravidei, estudei e decidi pelo parto normal, mas sabia que poderia precisar de uma cesárea. E tudo bem, não sofria com isso, de verdade.

Algo que eu não tinha dúvida, no entanto, era que a amamentação seria com leite materno e em livre demanda (sempre que o bebê solicita). Fiz um curso de amamentação online e aprendi sobre os inúmeros benefícios para a criança e para a saúde da mãe. No meu plano de parto, expressei meu desejo pela “golden hour” — quando o bebê é colocado para mamar na sua primeira hora de vida.

Ao completar 40 semanas, senti todas as dores do parto até atingir nove dedos de dilatação. Ian nasceu rapidamente. Que sorte eu tive! Agora viria o próximo passo: o bebê em meu colo para ser amamentado. Aqui começa a história que quase ninguém conta. Você até lê que há alguma dificuldade, mas sempre impera o clima de que é algo tão natural que tudo se ajeita rapidamente. Provavelmente o obstetra não vai abordar o assunto a fundo e aquela médica humanizada que você segue no Instagram vai dizer que o grande problema é a cultura da indústria da fórmula láctea.

Quando o bebê veio para os meus braços, eu sabia que a boca dele tinha de ter a abertura semelhante a de um peixinho, que o corpinho dele devia estar barriga com barriga comigo e que ele tinha de abocanhar a aréola. Lembrei de checar tudo, mas não contava com um fator importante: não estava ali sozinha com o bebê da teoria. Ian chegou sugando com pressão e força e não abria a boca suficientemente, nem com a ajuda da minha mão.

Na primeira abocanhada, voou sangue do mamilo na cara dele. A enfermeira veio ajudar e falou que estava tudo certo no manejo. Uma outra técnica confirmou. Passei para o outro seio: sangue e hematoma no primeiro minuto. Doeu. Doeu muito, mas achei que na próxima daria certo. Até posei para uma foto sorrindo.

Não, não deu certo na próxima nem nas seguintes. Piorou. Dois dias depois, veio a apojadura —momento em que o leite de fato desce. Eu também já conhecia o termo. Estava presente quando ela surgiu para minha cunhada, há um ano e meio. Ela passou mal, quase desmaiou, sentiu-se fraca e ofegante durante o banho. Comigo, porém, não foi assim.

Fui tomar banho esperando sintomas semelhantes, mas nada fora do normal ocorreu. De repente, acordei com as mamas muito inchadas. A dor era tão alucinante que quando os fios do cabelo tocavam o peito, eu beliscava minha perna para ver se me concentrava em outra dor. O desespero era tão grande que cancelei todas as visitas.

Duas enfermeiras, uma de cada lado, massageavam as mamas de três em três horas. Eu chorava antes, durante e depois dos procedimentos. O bebê passou a mamar sangue em todas as doloridas tentativas. Foi então que começou a tomar alternadamente fórmula e meu leite ordenhado em um copinho.

Eu detestava ver a cena do bebê bebendo leite no copo, embora soubesse que era o mais indicado na ausência do peito, para não causar a má afamada confusão de bicos. Ao mesmo tempo, sentia-me culpada por odiar a fórmula, afinal, não fosse meu privilégio social, nem teria essa saída. Fórmulas custam caro.

A cabeça foi para o espaço e eu fui para casa sem nem saber quem eu era direito. E permaneci assim por um mês e meio. Queria amamentar, mas odiava. Lembro de bater a cabeça na parede de tanta dor e de desejar que o relógio parasse para não ter de amamentar de novo. Procurava na internet mães que desistiram da amamentação e, curiosamente, só encontrava relatos daquelas que superaram todas as adversidades. Estava claramente procurando na minha bolha, já que, no Brasil, o tempo médio que uma mãe amamenta é de apenas 54 dias.

Comecei a acreditar que era eu quem não amava suficientemente o próprio filho, por isso me sentia daquela forma, sem vontade de amamentar e sem ânimo para qualquer coisa que não fosse chorar. Diagnóstico psiquiátrico: princípio de depressão pós-parto –ao mesmo tempo em que o país entrava de cabeça na pandemia pelo coronavírus.

Além da dor física, doía mais ainda ouvir e ler que se a mãe não está bem, o bebê não fica bem. Era como se alguém gritasse na minha cara que eu estava prejudicando o meu filho.

Remédio. Terapia. Amor da família. Rede de apoio. Eu tive tudo isso, mas a dor da amamentação não passava, as feridas não cicatrizavam. Era peito no sol, peito na compressa fria, peito na pomada, peito no laser e peito na boca do nenê, que lacerava novamente.

Consultora de amamentação 1, consultora de amamentação 2, banco de leite, vídeos, conversas com especialistas. Lancei mão de tudo, insisti. Por quê? Não faço ideia. Talvez por querer que Ian tivesse todos os benefícios nutricionais, uma vez que, nos primeiros dias, não conseguia doar todo o meu afeto? Seria perfeccionismo? Ou por almejar ter a liberdade de alimentar meu filho a qualquer momento e em qualquer lugar, sem ter de esterilizar mamadeiras e carregar trambolhos? Hoje, penso que foi tudo isso.

Usei bombinha elétrica para tirar leite (tenho trauma do barulho que ela faz até hoje), fiz ordenha manual, Ian tomou leite no copinho, na colher dosadora e na mamadeira. Tive mastite e necessitei de antibiótico. Enquanto isso, insistia em colocá-lo no peito.

Precisei dar fórmula nos primeiros dias em casa também, mas não fazia ideia de como oferecer, só sabia sobre aleitamento materno. É ridículo para uma jornalista, que prega ouvir todos os lados, ter ido apenas atrás da informação que me interessava.

Durante a gestação, imaginava as respostas que daria quando falassem que era hora de desmamar ou quando sugerissem que seria melhor me esconder para amamentar, mas, no fim das contas, o pitaco que eu mais desejava ouvir era “minha filha, use logo uma mamadeira e pare de sofrer”.

Das poucas opiniões que recebi, uma das mais clássicas: “Seu meu leite não está sustentando o bebê”. Diante da perda de peso dele nas duas primeiras semanas, parecia muito real, o que me jogou ainda mais para baixo.

No mais, todas as pessoas a minha volta respeitaram a minha vontade de persistir amamentando. Enfim, depois de longas semanas, o negócio engrenou.

Quando estava no terceiro mês e tudo parecia normal, uma nova inflamação e um ducto lactífero entupido surgiram. Dor lancinante. O tratamento: usar uma agulha esterilizada ou esfregar uma toalha molhada até estourar a bolha de leite formada no mamilo, além de massagear as ingurgitações doloridas que apareceram no seio. Tentei tudo, sem sucesso imediato. Feito isso, coloquei o bebê para mamar em diferentes posições, a principal delas era a que eu ficava em quatro apoios com o seio na boca do bebê. A cena se repetiu no quarto mês e no quinto, com uma nova mastite e um febrão de três dias.

Alguém já viu alguma propaganda, filme, série ou novela com uma mãe nesta posição? Só observo mãe e filho se entreolhando e sorrindo, como se fosse um ato totalmente instintivo.

Nesta última crise, a ferida aberta no terceiro mês voltou a incomodar. Ao redor dela, o mamilo fica todo esbranquiçado, como se não circulasse sangue na região. Arde demais.

Obviamente nem todas as mães percorrem essa via crucis e muitas sentem prazer desde o início com a amamentação, mas isso não pode ser considerado o padrão. É necessário falarmos sobre as dificuldades para munirmos de informação outras mulheres. Sabendo dos eventuais problemas, podemos buscar soluções que não sejam o desmame precoce, para quem deseja continuar, e também apoio, para quem prefere desistir.

Seria hipocrisia dizer que não me orgulho de olhar as dobrinhas do Ian, frutos da amamentação. Ainda assim, não penso que toda mãe deva passar por isso, sobretudo as que têm pouco ou nenhum apoio. Respeitar-se e estabelecer limites também são atos de amor. Amor próprio e amor materno.

Embora eu reconheça o vínculo que se estabelece por meio da amamentação, posso dizer que aqui em casa o entrosamento não veio por meio dela, ao menos não apenas por essa via. Hoje, o amor pelo meu filho é imenso, ao ponto de sentir saudade de estar perto dele mesmo estando no cômodo ao lado, e amamentar deixou de ser um peso.

A maternidade tem um mantra, o “vai passar”. Junto dele deveríamos incluir “não julguemos outras mães. Não nos comparemos. Falemos sobre nossos filhos e nossas experiências sem precisar esfregar na cara de mães que estão inseguras nosso sucesso com as tais siglas LM/LD/PN/SN, entre outras. Não meçamos outro maternar com a nossa própria régua”.

Feliz fim de agosto dourado e início de primavera florida para quem amamenta no peito, para quem oferece mamadeira e principalmente para quem faz uso real da palavra da moda: empatia.”

 

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Problemas com a amamentação? Veja locais que oferecem ajuda de graça https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/08/06/problemas-com-a-amamentacao-veja-locais-que-oferecem-ajuda-de-graca/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/08/06/problemas-com-a-amamentacao-veja-locais-que-oferecem-ajuda-de-graca/#respond Thu, 06 Aug 2020 20:21:48 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2020/08/WhatsApp-Image-2020-08-05-at-16.22.26-320x213.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=8932 Apesar da amamentação estar cada vez mais na mídia, é muito comum ouvirmos relatos de mulheres que, mesmo informadas, penaram até a amamentação engrenar.

O respeito à hora dourada (a primeira de vida fora do útero e que o bebê fica em contato pele a pele com a mãe), a pega correta e a distância de mamadeiras e chupetas para evitar confusão de bico não significam sucesso no processo.

Débora que o diga. A mãe da pequena Lucia, de 4 meses, teve apoio no hospital onde a filha nasceu e contou com quatro visitas de uma consultora em amamentação ao longo dos últimos meses. Porém, até hoje passa por incômodos que achava que estariam distantes pelas informações que adquiriu ainda grávida.

“Uma das partes mais difíceis foi a apojadura [descida do leite, que pode ocorrer de 3 a 7 dias depois do parto]. Você tem alta do hospital e sozinha em casa, por causa da pandemia, se vê perdida, com dor, febre e sem saber posicionar o bebê, mesmo sendo algo tão simples”, conta.

“A desinformação ainda é a maior barreira a ser vencida para mudar o perfil de amamentação do nosso país. Muitas gestantes pensam que a amamentação é um processo instintivo e se informam pouco sobre o assunto durante o pré-natal”, observa Cristina Nunes dos Santos, coordenadora da sala e parto e alojamento conjunto do Hospital Sepaco, em São Paulo.

Para se ter uma ideia de como amamentar não é instintivo, a Sociedade Brasileira de Pediatria recomenda que a gestante tenha uma consulta com o pediatra ainda durante o pré-natal com 32 semanas de idade gestacional para se preparar para amamentar, mas essa prática não é comum no Brasil.

Deixar programada uma consulta para avaliação da amamentação de 48 a 72 horas após a alta hospitalar também pode ajudar no processo. “Pode ser na UBS ou Banco de Leite mais próximo da sua casa, uma consultora de amamentação ou com o pediatra”, explica Cristina.

Apesar das dores, culpa e até frustrações que passou, Débora conta que insistiu na amamentação por causa dos benefícios que Lucia teria e a insistência trouxe muitos resultados. A bebê está saudável, ganhando peso e apesar das dores que vivenciou por muitas ocasiões, a mãe comemora o resultado.

Em uma situação diferente está Aline. Sua filha, Lorena, de 8 semanas, nasceu bem antes da hora. A data provável do seu parto era 20 de setembro, mas uma pré-eclâmpsia antecipou o parto e a bebê, que nasceu com 26 semanas e 730 gramas, precisou ficar internada no Hospital Santa Joana, em São Paulo, desde então.

Lorena chegou a utilizar leite materno do banco de leite do hospital e hoje toma apenas o leite da mãe. “É impressionante como o leite materno tem trazido resultados no ganho de peso dela”, conta a mãe, que doa em média, 200 ml por dia ao hospital.

“Lorena precisou da doação e do mesmo jeito que foi beneficiada quero ajudar outros bebês na mesma situação”, afirma a mãe.

A previsão de alta é no próximo mês. Enquanto isso, Aline continua extraindo leite do peito e cuida dos hábitos alimentares, aguardando o dia em que pegará a filha e poderá amamentá-la direto no peito, em casa.

“O leite de uma mulher que teve bebê prematuro é diferente do leite de uma mãe que teve o filho com 40 semanas, por exemplo. O leite  tem nutrientes compatíveis com a necessidade de cada bebê”, explica Mercedes Sakagawa, nutricionista e coordenadora responsável pelo lactário e Banco de Leite Humano do Grupo Santa Joana.

Segundo ela, o corpo sempre vai se adaptar e produzir nutrientes necessários para cada fase do bebê. A profissional ressalta também que o leite da mãe tem benefícios de transferência imunológica que nenhum outro alimento pode oferecer.

ENCONTRE APOIO

Para quem não pode pagar pelos serviços de uma consultora em amamentação ou não que sair de casa durante a quarentena, para evitar se contaminar pelo novo coronavírus, segue uma lista de locais que apoiam lactantes de graça. Vale lembrar que gestantes e puérperas fazem parte do grupo de risco e muitas dúvidas podem ser sanadas por telefone, ou chamada de vídeo pelo WhatsApp, inclusive.

Grupo de Quinta – Grupo de Amamentação da Lumos Cultural – SP
Projeto da Lumos cujo objetivo é reunir gestantes e lactantes para discussões à respeito deste tema tão complexo. A roda acontece toda quinta-feira, às 14h30, gratuita e sem necessidade de inscrição prévia. A moderação fica à cargo da fonoaudióloga Kely Carvalho e da pediatra Renata Lamano tendo como premissa o respeito à individualidade e o acesso à informação baseadas em evidências científicas. Durante a pandemia a roda acontece virtualmente. Telefone: (11) 3862 5327 ou (11) 3872 6344


GVA (Grupo Virtual de Amamaentação – Facebook) – https://www.facebook.com/groups/grupovirtualdeamamentacao


Casa Curumim – SP

Rua Pereira Leite, 513, Sumarezinho, São Paulo – SP,

 Atendimento toda terça, no período da manhã, precisa agendar. Telefone: (11) 98133-9360 e (11) 3803-9926

Aplicativo Bella Materna

Em comemoração ao mês de incentivo à amamentação, o Agosto Dourado, a MAM disponibiliza um cupom de acesso a um mês de teste no aplicativo Bella Materna. A experiência oferece às mães e grávidas o acesso gratuito, 24 horas por dia, a consultas com pediatras, obstetras e enfermeiras, além de contar com um conteúdo exclusivo, informativo e especializado. Para utilizar o aplicativo, basta se cadastrar, inserir o cupom e começar a experiência de um mês, até 31 de agosto.  O aplicativo está disponível para Android e iOS, ou pode ser baixado por meio do link: https://www.bellamaterna.com.br/.


Lactare, banco de leite da Eurofarma

Telefone (11) 4144-9604, por WhatsApp (11)  96629-0681 e por e-mail:  bancodeleite@eurofarma.com.br

Hospital da Mulher – Santo André- SP

Rua América do Sul, 285 – Parque Novo Oratório,  Santo André – SP

Segunda a sexta-feira, das 8h às 18h, Telefone: (11) 4478-5048 ou (11) 4478-5027


Banco de Leite – Unifesp – SP

R. Dr. Diogo de Faria, 395 – Vila Clementino, São Paulo – SP, 04037-001

Telefone: (11) 5576-4891

 


Banco de Leite do Hospital Fêmina – Porto Alegre- RS

Rua Mostardeiro, 17, 8º andar,  Porto Alegre, RS

Telefone: (51) 3314-5362

 


Mais endereços e telefones espalhados pelo país (cadastrados na Rede Brasileira de Bancos de Leite Humano)

Norte: https://producao.redeblh.icict.fiocruz.br/portal_blh/blh_brasil.php?regiao=norte

Nordeste: https://producao.redeblh.icict.fiocruz.br/portal_blh/blh_brasil.php?regiao=nordeste

Sudeste: https://producao.redeblh.icict.fiocruz.br/portal_blh/blh_brasil.php?regiao=sudeste

Centro-oeste: https://producao.redeblh.icict.fiocruz.br/portal_blh/blh_brasil.php?regiao=centro-oeste

Sul: https://producao.redeblh.icict.fiocruz.br/portal_blh/blh_brasil.php?regiao=sul


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Jornalista relata em livro glórias e perrengues com bebê nascida durante a quarentena https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/07/06/jornalista-relata-em-livro-glorias-e-perrengues-com-bebe-nascida-durante-quarentena/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/07/06/jornalista-relata-em-livro-glorias-e-perrengues-com-bebe-nascida-durante-quarentena/#respond Mon, 06 Jul 2020 13:25:10 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2020/07/WhatsApp-Image-2020-07-03-at-10.20.32.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=8907 De uns anos pra cá ficou mais comum ouvirmos mulheres falarem abertamente sobre o puerpério. O que antes era escondido ou amenizado passa a ser compartilhado abertamente e tira um baita peso das costas das mães recentes que estão enfrentando privação do sono, desconforto com o novo corpo, medo e inseguranças com um ser tão dependente diante delas.

No passado, esse período costumava ser mais leve para as mulheres. Vizinhas e parentes que moravam perto auxiliavam nos afazeres domésticos, enquanto a atenção da puérpera estava voltada exclusivamente para o bebê.

Com a pandemia do novo coronavírus, muitas famílias se separaram fisicamente e grande parte das mães tiveram que abrir mão de qualquer tipo de ajuda externa. Agora, o isolamento é duplamente mais pesado.

Violeta nasceu em meio a tudo isso. Filha de um casal de jornalistas, Anna Virginia Balloussier e Victor Ferreira, a pequena certamente não sente falta do mar, das festas ou do Carnaval como seus pais, mas ainda não conheceu os avós paternos e o contato externo é bem restrito. Desde seu nascimento, no dia três de março, sua mãe passou a escrever um diário, que agora virou livro. Nele, conta perrengues e alegrias dos primeiros 40 dias da filha trancada com os pais, em um apartamento em Copacabana, no Rio.

Já tive oportunidade de trabalhar por um período com a Anna na TV Folha. Ela é responsável por algumas reportagens memoráveis na editoria: Crianças de 9 religiões diferentes desenham seu jeito de encarar DeusA Copa VIP dos “yellow blocs” e  Alemanha 7, Brasil 1: O dia do massacre do Mineiraço, quando assistiu à final da Copa ao lado de Paulo Maluf.

No jornal, seus textos sempre figuraram entre os mais lidos. Ela escreve bem, já foi correspondente da Folha em Nova York e exibe uma postura segura para todos que a cercam. No livro, ela desmonta tudo isso. Decide abrir medos, inseguranças e traumas que fazem dela ainda mais admirável.

 

Filha de Anna e Victor, Violeta nasceu durante o início da quarentena (Foto: Arquivo Pessoal)

Talvez ela não precise de mim – Diários de uma mãe em quarentena  fala de choro, dúvidas, virilha sem depilação e retorno à vida sexual. Fala também daquele amor diferente de todos os outros, aquele que era sonhado e desejado a cada sopro de velinhas de aniversário.

“Ser bem-sucedida no trabalho, reconhecida pela minha escrita, tudo isso é importante pra mim. Mas me desconsertava muito mais a perspectiva de morrer sem filhos do que ter um texto destroçado por alguém que eu admire, embora eu projete para o mundo exterior que a segunda hipótese me abalaria mais. Empregar bem uma vírgula preenche um ego, não uma vida”, diz um trecho do livro.

Cólicas, diferenças conjugais e muita cumplicidade também aparecem no livro (Victor é daqueles pais que cumprem seu papel, além de saber a quantidade de amaciante ideal ao lavar as roupinhas). E por fim, há alguns socos no estômago. “Escrevi porque precisava expurgar”, conta a jornalista.

Apesar do nascimento ter ocorrido no meio de uma pandemia terrível, Violeta é abençoada. Não só por ter a mãe por perto o dia inteiro, mas por essa mãe ser a Anna.

SERVIÇO

Talvez ela não precise de mim – Diários de uma mãe em quarentena (Todavia, 80 p.)

E-book com promoção de lançamento: R$9,90

Livro impresso: R$30 + frete

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Pandemia obriga mães a pedirem demissão após licença-maternidade https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/06/23/pandemia-obriga-maes-a-pedirem-demissao-apos-licenca-maternidade/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/06/23/pandemia-obriga-maes-a-pedirem-demissao-apos-licenca-maternidade/#respond Tue, 23 Jun 2020 13:55:29 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2020/06/WhatsApp-Image-2020-06-22-at-19.11.50.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=8886 Em meio à pandemia do coronavírus, mães que estão de licença-maternidade e precisam retornar ao trabalho estão preocupadas com o futuro dos filhos. Sem poder colocá-los em creches ou contratar babás, muitas delas são empurradas a pedir demissão por não encontrarem uma saída.

“Não sei o que fazer. Preciso voltar pessoalmente para a empresa, lá não tem home office lá. Fora isso, não tenho parentes por perto, nem posso contratar ninguém para ficar com meu filho”, diz Rute*, mãe solo de Matheus*.

Marcela* também está prestes a voltar ao trabalho após quatro meses de licença-maternidade e mais um mês de férias. Apesar da possibilidade de trabalhar no esquema de home office, não sabe como vai fazer com a pequena Ingrid*. Seu marido trabalha em horário comercial, ela não tem parentes próximos nem pode contratar uma babá para a menina.

“Sem escola, como vou fazer com a bebê sem comprometer meu trabalho? É uma vantagem estar em casa, mas a minha filha vai exigir uma atenção que meus patrões não estão dispostos a permitir”, lamenta a profissional que já pensou em pedir demissão assim que retornar.

“Meu pensamento desde o início era de colocar meu filho na creche, mas com a pandemia, não consegui fazer a matrícula. Meus sogros moram perto, mas os dois trabalham. Minha mãe é de outro estado e não pode ficar aqui porque é grupo de risco”, conta Beatriz*.

“Por um lado, sair do trabalho e ficar cuidando dele seria maravilhoso, pois acompanharia todo o desenvolvimento. Por outro lado, sair do trabalho no meio dessa crise é desesperador. Qual garantia vou ter que conseguirei retornar ao mercado de trabalho? Como vou sustentar meu filho?”, questiona a auxiliar de escritório.

“É uma escolha muito difícil, mas até o momento o que está mais certo é que terei que arriscar e parar de trabalhar. Vou colocar meu filho em primeiro lugar” diz Beatriz*, que retornará da licença daqui 10 dias.

Sem escolas, nem parentes disponíveis para ficar com os bebês, mães são obrigadas a pedir demissão após o fim da licença-maternidade (Imagem: Adobe Stock)

Pensando em reduzir essa vulnerabilidade, a deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) apresentou o projeto de lei 2765/2020, que garante a ampliação da licença maternidade de 120 para 180 dias, e o da licença-paternidade, de 5 para 45 dias.

O texto, que está na fila para ser votado com urgência, também cria a licença-cuidador, que visa ampliar o período de licença para cuidados com o bebê por mais 180 dias. Neste caso, ela pode ser compartilhada com o companheiro, a critério da mãe, sem prejuízo do emprego e nem do salário.

“Em condições normais, 50% das mulheres são demitidas após o retorno da licença. Pensando em uma crise sanitária, sem perspectiva de fim, a situação ainda é pior. Sabemos que muitas empresas podem quebrar e, como sempre, as consequências das crises recaem sobre as mulheres”, afirma a deputada.

Integrante da Bancada Ativista em São Paulo, a deputada estadual e presidente da Associação Artemis, Raquel Marques, lembra que o ECA e a Constituição Federal dizem que crianças são responsabilidade do Estado, da sociedade e das famílias. “Na prática o Estado assume pouca responsabilidade, a sociedade, representada pelas empresas, também fazem pouco e a criança passa a ser vista como problema privado da família e, em última instância, apenas da mulher que a pariu”.

“De um lado a mulher precisa trazer sustento -lembrando das muitas famílias que são chefiadas por mulheres- e ao mesmo tempo se a mãe deixa a criança em casa é abandono de incapaz. Essa conta só fecha colocando uma vida em risco, deixando criança sozinha ou abrindo mão do emprego e tendo consequências financeiras”, afirma a ativista.

Raquel lembra que para o projeto ganhar força no Congresso é preciso pressão popular. Ela cita o envio de e-mails cobrando dos deputados a inclusão do projeto na pauta como uma urgência como uma das formas de mobilização.

“Não é possível que o cuidado com as crianças seja colocado como algo não prioritário. Estamos expondo a vida das crianças e aumentando a desigualdade dessas mulheres. Esse assunto não pode ser tratado como um problema privado”, reforça Raquel Marques.

*Os nomes foram trocados a pedido das mães.

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Medo, angústia e nova rotina; grávidas contam o que mudou com o coronavírus https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/03/24/medo-angustia-e-nova-rotina-gravidas-contam-o-que-mudou-com-o-coronavirus/ https://maternar.blogfolha.uol.com.br/2020/03/24/medo-angustia-e-nova-rotina-gravidas-contam-o-que-mudou-com-o-coronavirus/#respond Tue, 24 Mar 2020 12:48:06 +0000 https://maternar.blogfolha.uol.com.br/files/2020/03/WhatsApp-Image-2020-03-23-at-11.20.31.jpeg https://maternar.blogfolha.uol.com.br/?p=8801 A vida de muita gente mudou por causa do coronavírus e as grávidas não ficaram de fora. Além das questões psicológicas, aspectos práticos como cancelamento de exames e dispensa de funcionários têm mudado a rotina de muitas mães ouvidas pelo Blog Maternar.

Grávida de quase 40 semanas, Amanda Oliveira mudou radicalmente a organização da casa por causa da pandemia. O primeiro filho, de três anos, estava em adaptação escolar e precisou deixar a escola quando estava começando a se acostumar com a nova rotina. A gestante precisou dispensar duas funcionárias que a ajudariam com os afazeres da casa e com os filhos no futuro.

“Desmarquei o último ultrassom e não irei mais às consultas presenciais”, diz a moradora de Santo André (SP), que está saudável e teve o aval do médico para ficar em casa.

Rubia Stevanato, que mora em Maringá (PR), também está isolada em casa com o filho de um ano e nove meses. Ela está grávida de nove semanas e não conseguiu marcar o primeiro ultrassom e nem os exames laboratoriais simples como os de sangue ou urina.

“É uma gestação às cegas. Estou com medo porque faço parte do grupo de risco. Espero que tudo isso passe até outubro, data prevista do parto. Tenho medo de precisar de atendimento médico e não poder ir pro hospital pelo risco de contágio. Não quero colocar nossa vidas em risco”, diz a gestante, que foi hospitalizada algumas vezes durante e após a primeira gestação por problemas no sangue.

Segundo a psicóloga Damiana Angrimani, que atua com grávidas e puérperas, a situação mundial inédita tem gerado muita ansiedade e angústia nas grávidas e isso é totalmente normal.

“Socialmente é imposto às gestantes nunca reclamarem. Está tudo bem se sentir assim. Não dá para fingir que nada está acontecendo. Isso seria ainda mais prejudicial”, explica.

Para a especialista, é preciso dar vazão a todos esses sentimentos e encontrar acolhimento, uma vez que a gestação já evidencia diversas vulnerabilidades na mulher  –a principal delas a falta de controle sobre as coisas.

Ela orienta às futuras mães a reconhecerem seus limites e repensarem algumas escolhas, como sair de grupos onde há excesso de informação sobre o coronavírus (caso isso seja motivo de angústia), ou escolher horários e sites para se informar sobre o assunto (leia a Folha), mas sem passar o dia todo sendo bombardeada de informações ruins.

Preocupada com o pós-parto, Fernanda Fonseca Bernardes, que mora em Brasília (DF), conta que chegou a achar exagero o decreto de quarentena. Mas depois, entendeu a necessidade do isolamento.

Ativa, ela fazia academia, trabalhava o dia todo e agora está sentindo ter que ficar em casa, reclusa. “Apesar de ruim, estou encarando como uma preparação para o próximo mês [quando o bebê nascer]”.

“Estou tranquila porque estamos na reta final da gestação. Creio que se fosse no começo estaria com mais medo”, diz a mãe, citando problemas de formação no feto.

Segundo a Organização Mundial de Saúde, não há relatos de malformações em bebês por causa do coronavírus. Também não houve casos de contaminação de gestante para o feto e nem pelo leite materno.

“Acredito que teremos problemas familiares, pois vamos restringir ao máximo as visitas, inclusive dos avós. “O bebê, [que é o primeiro neto dos dois lados], é muito vulnerável. Não queremos que ele fique doente”, lamenta a gestante.

CONSULTAS MAIS OBJETIVAS

As mudanças na rotina também atingiram os atendimentos em consultórios médicos, como explica a obstetra Fabiana Garcia, do Espaço Mãe, em São Paulo.

Consultas presenciais foram encurtadas e questões sem urgência são resolvidas por chamada de vídeo ou mensagens de celular. “Pedimos às pacientes virem sozinhas ou acompanhadas de pessoas sem sintomas de gripe”, explica.

No dia do parto, caso a paciente esteja com sintomas de gripe ou já tenha sido confirmada a presença da Covid-19, haverá redução no número de profissionais acompanhantes durante o parto, e toda equipe usará máscara, luva e óculos para evitar o contágio.

A recomendação às mães é que se desloquem à maternidade apenas na hora ativa do parto. “A alta precoce também tem sido utilizada para que as pacientes e bebês fiquem o menos possível nos hospitais”, diz a médica.

Segundo ela, a presença de doulas nas maternidades de São Paulo também está restritas para pacientes assintomáticas, ou seja, sem sintomas de gripe ou resfriado.

Por fim, a obstetra ressalta que o contágio não é motivo para antecipar o parto. “O bebê que nasce antes da hora corre mais risco de ir para UTI e mais risco de encontrar alguém infectado. Ele está bem mais protegido dentro do útero que fora dele”, conclui Fabiana.

LUZ NO FIM DO TÚNEL

Apesar de tantas mudanças, a psicóloga Damiana Angrimani tem encontrado aspectos positivos no relato de suas pacientes. “Muitas puérperas dizem que o momento não está tão ruim, porque seus parceiros estão em casa. Isso faz com que se sintam menos sozinhas, sentimento tão comum entre as mães no pós-parto”.

A enfermeira obstétrica Cyntia Baraldi, da Casa de Parto Luz de Candeeiro, em Brasília (DF), também pontua relatos positivos em seus encontros online com as grávidas. “Ouvimos que o momento é de recolhimento, de fazer o ninho para o bebê que vem aí, de ter mais tempo para aproveitar a gestação e olhar para si. Se não fosse isso, a maioria delas estaria trabalhando oito, nove horas por dia, sem prestar tanto atenção na gestação como estão fazendo agora”.

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