Projeto de lei quer controlar índices de cesáreas em hospitais
Um projeto de lei que tramita na Câmara dos Deputados prevê a criação de uma comissão para monitorar os índices de cesáreas e as práticas obstétricas nos hospitais públicos, privados e filantrópicos do país. O Brasil é líder mundial em cesáreas com uma média de 52% dos nascimentos sendo feitos por meio da cirurgia. Na rede privada, esse número chega a quase 90%.
Pela proposta do deputado Jean Wyllys (PSOL), a comissão, que será formada nas esferas estadual e municipal, será responsável em notificar as instituições e o Ministério da Saúde caso os índices de cesárea ultrapassem os 15%, que é o recomendado pela OMS (Organização Mundial da Saúde).
Os profissionais de saúde e as instituições terão de justificar os altos índices de cesáreas e, se as justificativas não forem plausíveis e os índices continuarem altos, está prevista a criação de uma sindicância onde cada caso será analisado com a parturiente e a equipe médica sendo ouvidas.
Pela proposta, se a situação não for revertido em 90 dias, a comissão encaminhará o caso ao Ministério Público. As instituições poderão ser punidas com a suspensão, por prazo inicial de 30 dias, de pagamento pelos partos feitos por meio de cesáreas.
“A proposta tem mais um caráter educativo do que punitivo. A ideia é entender as justificativas e atuar na raiz do problema. Obviamente as punições precisam existir, senão, uma lei se torna inócua, mas a intenção maior é criar um compromisso de todos os atores com as melhores práticas obstétricas preconizadas pela OMS e o Ministério da Saúde, garantindo um parto de qualidade e reduzindo a mortalidade materna”, explica Raquel Marques, que é presidente da Artemis (entidade de defesa ao direito da mulher) e auxiliou o deputado na criação do projeto de lei.
Segundo ela, a cesárea não é um problema desde que seja feita com real indicação pois feita de forma eletiva ela acarreta riscos tanto para a mãe como para o bebê.
Além de reduzir o número elevado de cesáreas, o projeto também tem o objetivo de implantar o parto humanizado. A proposta é ampla e trata também de assuntos como a gestação, o parto e as condutas que devem ser adotadas pelos profissionais de saúde.
De acordo com o texto, os profissionais de saúde podem ser punidos civil, penal e administrativamente caso não justifiquem o uso indiscriminadamente de ocitocina sintética (para acelerar o parto), de episiotomia (corte feito entre a região do ânus e a vagina) e também a tração ou remoção manual da placenta. Também está previsto que a parturiente tenha direito de escolha sobre como será o parto, ou seja, a mulher terá direito a elaborar um plano de parto onde registra seus desejos na hora do nascimento do filho, como quem vai acompanhá-la, o tipo de parto que prefere, se desejar se alimentar durante o trabalho de parto, se quer se movimentar durante as contrações, se deseja tomar anestesia, entre outros detalhes.
Pela proposta, os profissionais devem dar preferência ao parto humanizado, ou seja, dar preferência para métodos alternativos de alívio a dor da parturiente e usar medicamentos e cirurgias somente quando for realmente necessário.
Além de permitir que o parto seja o mais natural e menos invasivo, a proposta do deputado é que o bebê seja colocado em contato imediatamente no colo da mãe ao nascer. Pela proposta, isso só não deve ocorrer se o bebê nascer com algum problema de saúde.
O projeto de lei também tem o objetivo de acabar com a violência obstétrica. A proposta de Jean Wyllys define atitudes como “tratamento desumanizado, abuso de medicalização e patologização de processos naturais, que causem a perda de autonomia e da capacidade das mulheres de decidir livremente sobre seus corpos e sua sexualidade”.
A proposta fala, inclusive, das ofensas verbais e físicas que as parturientes não podem sofrer durante o trabalho de parto e no pós-parto. Ignorar as queixas e solicitações da grávida também fazem parte desta lista assim como não permitir que ela grite ou se movimente durante as contrações. O projeto de lei também configura como uma violência obstétrica realizar cesárea sem indicação real clinica ou submeter a mulher a “procedimentos invasivos desnecessários ou humilhantes”.
O texto ainda será analisado pelas comissões de Educação; de Seguridade Social e Família; e de Constituição e Justiça e de Cidadania, para depois ser levado à votação na Câmara.