Médico do plano terá de informar paciente sobre número de cesáreas, diz ANS
A ANS (Agência Nacional de Saúde Suplementar) apresentou nesta terça-feira (14) propostas para pressionar os planos de saúde a reduzir o número de cesáreas no setor privado. Uma das principais medidas é que os obstetras que atendem pelo convênio informem as pacientes o número de partos normais e de cesáreas que realizam em suas pacientes.
A gerente de atenção à saúde da ANS, Karla Coelho, diz que a paciente deve ter direito à informação na hora de escolher o seu médico. A gerente afirma que as pacientes poderão solicitar essa informações tanto pelo plano como pelo hospital onde pretendem ter os seus bebês.
O Ministério da Saúde e a ANS vão abrir, a partir desta quarta-feira (15), uma consulta pública para que essa e outras medidas sejam discutidas com a sociedade.
Além de criar um ranking com o número de partos normais e cesáreas, os médicos do plano terão que preencher uma caderneta da gestante padrão. No papel, que ficará em posse da gestante, haverá dados sobre o histórico da parturiente, entre eles, exames realizados, se ela tem ou não gravidez de risco, enfim, o cartão trará todos os detalhes da paciente e do bebê.
A ideia é que esse cartão permita que ela seja atendida, por exemplo, por um médico plantonista no hospital, ou seja, não é necessário que o obstetra que fez o pré-natal acompanhe todo o trabalho de parto. O cartão também facilita a vida da gestante caso ela opte em trocar de médico durante a gestação.
Além da caderneta, os médicos deverão preencher durante o trabalho de parto um partograma – um papel que informa a dilatação, período das contrações, se a bolsa estourou ou não. “Esse papel permite saber quando a cesárea foi indicada e se teve real indicação ou não. A ideia é fazer com que evitem cesáreas agendadas sem a mulher sequer entrar em trabalho de parto”, explica a gerente.
O diretor-presidente da ANS, André Longo, diz que os médicos vão ser obrigados a fazer o partograma para que recebam dos planos de saúde. Longo explica que as medidas só devem entrar em vigor após serem discutidas na audiência pública. As contribuições poderão ser enviadas entre 24 de outubro e 23 de novembro. Para participar, basta entrar no site da ANS onde haverá um formulário disponível para que as sugestões sejam feitas. A expectativa é que as resoluções entrem em vigor em dezembro.
EPIDEMIA DE CESÁREAS
As resoluções estão sendo adotadas para reduzir o número de cesáreas no país, que chega a ser superior a 80% na rede particular e fica em torno de 50% no SUS (Sistema Único de Saúde), de acordo com a pesquisa “Nascer no Brasil” divulgada recentemente pela Fiocruz.
O ministro da Saúde, Arthur Chioro, diz que o Brasil sofre uma “epidemia de cesáreas no setor privado”. “Não somos contra a cesárea, mas não podemos admitir que as cirurgias sejam o normal e o parto normal seja exceção”, afirma.
Segundo o ministro, além do conjunto de medidas, é preciso mudar culturalmente a sociedade. “Nos anos 1970 o leite artificial e a chupeta era considerado o melhor para o bebê. Mas, conseguimos reverter essa realidade quando mostramos a importância do aleitamento materno”, comenta Chioro, que pretende fazer o mesmo em relação ao parto normal.
Karla ressaltou que o bebê que nasce de cesárea tem 120 vezes mais possibilidade de nascer com problemas respiratórios causados, principalmente, pela prematuridade. “A prematuridade é responsável por 25% dos óbitos neonatais”, diz. Ela comenta ainda que a cesárea triplica a mortalidade materna e que a mulher pode ter mais complicações, como perda maior de sangue, entre outras complicações. Segundo ela, a ideia não é ser contra a cesárea, mas que ela só seja feita com real indicação. De acordo com a OMS (Organização Mundial da Saúde), apenas 15% dos nascimentos deveria ser feito por meio de cirurgia.
As medidas da ANS só foram feitas após a Justiça Federal promover uma audiência pública em agosto onde pressionou a agência a fiscalizar os planos de saúde. O MPF (Ministério Público Federal) entrou com uma ação em 2010 exigindo que a ANS cobre dos convênios medidas para reduzir as cirurgias. Na audiência, a ANS se comprometeu em dar uma resposta em 60 dias e, por esse motivo, divulgaram as medidas nesta semana.
Questionado se os planos pagam mal para os médicos realizarem partos, o ministro diz que independente do valor, não é possível que os profissionais hajam apenas por questões financeiras. “Não posso inverter a indicação de um procedimento que pode aumentar a mortalidade materna, a prematuridade ou mesmo óbito infantil porque a remuneração está baixa ou não adequada. A vida não pode ter preço”, diz.
Apesar da divulgação da ANS e do Ministério da Saúde, a ação do MPF é ainda mais ampla e prevê seis medidas que colaborariam para conter o grande número de cirurgias.
Veja quais são os principais pontos da ação civil
1 – PARTO COM ENFERMEIRO OBSTETRA. A proposta é que os partos sejam acompanhados por enfermeiros obstetras, como ocorre na Europa. Os médicos atenderiam apenas os partos de risco
2 – DIVULGAÇÃO DOS DADOS. ANS deve obrigar os planos de saúde a publicar os percentuais de cesáreas e partos normais feitos por médicos e hospitais conveniados. A medida, diz o MPF, iria reduzir as cirurgias já que os procedimentos serão divulgados, ou seja, a paciente saberá se o médico faz mais cesáreas do que parto normal, por exemplo.
3 – REMUNERAÇÃO DIFERENCIADA. O MPF também quer formas diferenciadas de remuneração para parto norma ou cesárea. A ideia é seguir indicação do Conselho Federal de Medicina para se pagar quatro vezes mais pelo parto normal, já que ele pode durar 12 horas ou mais, enquanto uma cesárea pode ser realizada em poucos minutos.
4 – PRÁTICAS HUMANIZADAS. O MPF sugere também que ANS crie indicadores e notas de qualificação específicos para a redução no número de partos cirúrgicos, dizendo que o sistema atual de pontos da agência – a Política de Qualificação em Saúde Suplementar – tem um peso pequeno demais diante da gravidade do problema.
5 – PARTOGRAMA. O MPF diz ser imprescindível a adoção de um partograma – um prontuário detalhado de tudo o que ocorreu durante o parto, com dados sobre a evolução do trabalho de parto. Esse documento possibilitaria uma avaliação posterior sobre a real necessidade de uma cesárea.
6 – CARTÃO DA GESTANTE. Os planos teriam a obrigação de oferecer o cartão da gestante – já usado na rede pública. A medida permite que outros médicos atendam a parturiente em caso de uma emergência, por exemplo.